COM DESEMPREGO ESTABILIZADO E PERDA DE RENDA, MERCADO DE TRABALHO DEVERIA PAUTAR O DEBATE POLÍTICO

Rodrigo Trindade

Reconhecer os erros, se desculpar e – principalmente – trabalhar para remediar os problemas causados, é um dos maiores sinais de amadurecimento e honestidade que se pode mostrar. Parece frase de livro de autoajuda, mas poucas vezes essa singeleza foi tão necessária para encontrar caminhos para curar o achacado mercado de trabalho brasileiro. Encaminhando-se para o quinto ano de vigência da Reforma Trabalhista, as opções de construções políticas e normativas vêm se mostrando com resultados infelizes, e pouco se faz para discernir tantas gafes.

Em país com muitos mercados de trabalho – com informais escondidos da fiscalização, autônomos jogados na falta de opção de sobrevivência e, subempregados crônicos – há muito mais a ser conhecido para entender como está o mercado de trabalho.

Já não se trata mais – embora já fosse suficientemente penoso – de números absolutos de desemprego, remediadamente estacionados em dois dígitos. De janeiro a março de 2022, a taxa de desemprego ficou estável no trimestre em 11,1%, e com queda em relação ao mesmo período de 2021 (14,9%), na recuperação da pandemia. Mas a ainda tímida recuperação pós Covid-19 do número de pessoas ocupadas é produzida ao custo de trabalho de má qualidade.

Não se pode mais justificar com frases feitas que unem simplicidade da estrutura econômica nacional com a falta de investimentos externos. A doença é outra.

Aqui, fizemos longo levantamento das consequências do direito do trabalho precarizante da Reforma Trabalhista na debilitação do mercado de trabalho nacional. Os levantamentos econômicos mais recentes confirmam essa persistência.

Já em 2020, levantamento da consultoria IDados apontou que 525 mil trabalhadores com diploma, entre 22 e 25 anos, são considerados sobre-educados – exercem ocupações que não exigem faculdade.

Já a perda de renda está muito mais espalhada. Dados da Pnad Contínua, mostram que o rendimento médio do brasileiro caiu 8,7% entre março de 2021 e deste ano. Segundo a pesquisa, o brasileiro recebia, em média, R$ 2.789 em março do ano passado, enquanto em 2022, o valor caiu para R$ 2.548. A redução entre os três primeiros meses de 2021 e o primeiro trimestre deste ano é de 8,7%. E tudo isso em cenário inflacionário que já atingiu 10%, com recuo na capacidade de compra da população.

A população ocupada, estimada em 95,3 milhões, caiu 0,5% na comparação com quarto trimestre, o que significa 472 mil pessoas a menos no mercado de trabalho. Ante o mesmo período de 2021, o número subiu 9,4% (mais 8,2 milhões de pessoas). No mesmo período, o rendimento médio mensal da população 1% mais rica foi quase 34 vezes maior que da metade mais pobre em 2018. Isso significa que a parcela de maior renda arrecadou R$ 27.744 por mês, em média, enquanto os 50% menos favorecidos ganharam R$ 820. Os problemas mais urgentes não andam na “falta de preparo” ou na “simplicidade da economia nacional”, mas na intrínseca desvalorização do trabalho.

A negociação coletiva – pretensamente ampliada com a Reforma – não tem alcançado benefícios aos trabalhadores. Ao contrário. Conforme dados do Dieese, em março de 2022, 52% dos acordos coletivos negociados entre sindicatos de trabalhadores e patronais estabeleceram reajustes salariais abaixo da inflação acumulada. Ou seja, o trabalhador, na prática, perdeu poder de negociação.

Há âncoras que impedem a retomada do trabalho de qualidade, e uma muito grande chama-se Reforma Trabalhista. Enquanto as causas não forem enfrentadas, seguirão as desculpas.

Nas bodas de madeira da reforma que prometeu gerar empregado e renda, o que se produziu foi o aumento da fatia dos informais, com consequente incapacidade de ampliação do mercado de consumo a partir da renda do trabalho. Apenas a taxa de informalidade brasileira chega a mais de 40%, com cerca de 38,2 milhões de pessoas. No quarto trimestre, a taxa havia sido de 40,7% e, no mesmo trimestre, de 2021, 39,1%.

Os mais recorrentes desvios morais se produzem com o silêncio sobre os próprios equívocos. Mas fica muito mais preocupante quando se pretende insistir e camuflar as próprias faltas. Seria muito mais útil que o debate político se pautasse para além das disposições de opções de moral individual. Para aqueles que vivem do trabalho, o que vai além disso é pouco mais que miudezas.

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