Lei 13.429 de 2017 e a intermediação de trabalho no Brasil: perspectivas políticas e hermenêuticas

Lei 13.429 de 2017 e a intermediação de trabalho no Brasil: perspectivas políticas e hermenêuticas

(Publicado em 04 de abril de 2017)

Rodrigo Trindade

A Lei 13.429/2017 já se apresenta como a mais importante modificação nos paradigmas do trabalho-emprego no Brasil, desde 1943, ano em que a CLT iniciou vigência. Sua verdadeira extensão ainda é extremamente incerta e depende de três grandes fatores:

  1. a) Projetos de Lei análogos e incidentes

Prováveis novas leis incidentes sobre a matéria podem surgir nos próximos meses, especialmente as oriundas de controvertidos projetos legislativos em discussão no Congresso Nacional. São elas:

 

  • PL 6.787/2016 (Reforma Trabalhista);
  • PLC 30/2015 (projeto no Senado, também de terceirização);
  • PL 218/2016 (jornada intermitente);
  • PL 1.572/2011 (limitação do poder fiscalizatório do Estado);
  • PL 1.572/2011 (anteprojeto de lei do Código Comercial).
  • PL 6.442/2016 (trabalho rural)

Soma-se a isso relatos de publicação de Medida Provisória visando esclarecer e complementar alguns pontos da Lei 13.429/2017.

  1. b) Hermenêutica

O diploma em comento tem potencial de grandes modificações nas relações trabalhistas. Abre-se perspectiva de alargamento de modo de organização do trabalho, com grande substituição do trabalho-emprego “direto” pelo trabalho temporário e terceirizado.

A exata extensão de conceitos altamente incertos presentes na Lei 13.429/2017 em larga escala dependerá da magistratura nacional. Como poucos outros ramos da ciência jurídica, o Direito do Trabalho (e especialmente o brasileiro) depende da hermenêutica judiciária. Os mais de mil verbetes sumulares do TST bem demonstram a importância da interpretação oferecida pelos juízes e juízas do trabalho para a fixação de práticas e pretensões de condutas entre os jurisdicionados.

  1. c) Reação dos movimentos sindicais e empresariais

Os projetos de ampliação da terceirização e trabalho temporário foram acompanhados de forma refratária pela maior parte dos sindicatos e suas centrais. Em contra partida, organizações empresárias realizaram intensas gestões para avanço do projeto legislativo. Aguarda-se que as mesmas agremiações sigam oferecendo forte reação às ampliações possibilitadas pela lei.

  1. Origens da Lei

A segunda metade dos anos 1990 foi de profunda modificação na economia nacional, especialmente determinada pela globalização econômica e novas formas de organização do mercado. Também foi acompanhada de tentativas de implementação de políticas de corte neoliberal tendentes à diminuição de dirigismos contratuais trabalhistas, novas formas de contratação e facilitação de rescisões.

A Lei n. 13.429/2017 tem origem no Projeto de Lei 4.302/1998, apresentado pelo Poder Executivo em 19/3/1998. Em sua mensagem, o Sr. Presidente da República fez considerações correntes para a época, referindo o “contexto de inserção da economia brasileira em um mundo globalizado e de modernização das formas de produção”. Concluiu fazer-se “necessária a adaptação dos instrumentos normativos que regem o mundo do trabalho, em busca de maior flexibilidade nas formas de contratação e de procedimentos mais ágeis e adequados à realidade das empresas” (Mensagem 344/1998).

Diversas outras iniciativas legislativas surgiram nesse contexto, algumas foram aprovadas e seguem vigentes, como a Lei n. 9.601/1998 (contrato de trabalho por prazo determinado) e 9.958/2000 (comissões de conciliação prévia). Em comum, tinham objetivo de oferecer adaptação de novo ambiente de competição internacional a pretensões empresárias de diminuição de custos de produção a partir da precarização de salários, benefícios trabalhistas e rescisões contratuais.

Após algumas emendas e apresentação de substitutivo, o PL 4.302 foi chancelado na Câmara e, com modificações, também no Senado Federal. Em 17/12/2002, o Senado aprovou novo substitutivo e devolveu a proposta para análise definitiva da Câmara. Mas já no final de 2002, passou a restar claro que o projeto de lei não receberia no Parlamento a atenção esperada pelo Executivo e o resultado foi diminuição drástica da velocidade de tramitação.

Seguindo-se a modificação política, em 19/8/2003, novo Presidente da República enviou a Mensagem n. 389 ao Parlamento solicitando a retirada do projeto. Esse requerimento jamais foi apreciado e esse fato deverá ser o primeiro para possível alegação de vício na Lei n. 13.429/2017.

Em 22/3/2017 foi protocolizado recurso de Reclamação na Câmara dos Deputados em razão da não submissão ao Plenário da Mensagem da Presidência da República de baixa do projeto. O presidente da Câmara rejeitou liminarmente e houve recurso à Comissão de Constituição e Justiça.

Até 2016, a tramitação foi apenas protocolar, com trocas de relatores nas comissões e ausência de ânimo de efetiva discussão. A ressuscitação ocorreu em 2017, em razão de outro projeto com mesmo objeto. Trata-se do PL 4.330/2004, que também visa ampliação da terceirização, foi aprovado na Câmara dos Deputados e recebido no Senado, em abril de 2015, como PLC 30/2015. Em razão de designação de relator contrário à ampliação da terceirização, foi colocado em dormência.

Seguindo-se novo Executivo, posicionado em impulsionar projeto de ampla modificação no mundo do trabalho, decidiu-se por reanimar o antigo projeto da Câmara dos Deputados. Sem interlocução com os aportes do PLC 30/2015, muito mais recente e discutido em diversas audiências públicas pelo país, o PL 4.302/1998 foi rapidamente desengavetado, votado e, finalmente, sancionado em 31 de março de 2017.

O PLC 30/2015, todavia, segue em tramitação, apresenta redações diferentes para artigos da Lei n. 6.019/74, opções distintas para regulamentação do trabalho arregimentado. Somam-se relatos de possível medida provisória esclarecendo e ampliando pontos da Lei 13.429/2017. Portanto, é possível que a regulação dos institutos possa sofrer novas e próximas alterações.

  1. Breves considerações sobre a terceirização e trabalho temporário no Brasil

Em poucas palavras, terceirização e contratação temporária têm em comum a transferência para outrem dos custos da contratação do trabalho.

Enquanto no trabalho temporário pactua-se fornecimento de trabalhadores que ficarão por curtos períodos subordinados ao tomador, na terceirização contratam-se serviços especializados, executados autonomamente por empresa prestadora.  A terceirização vinha sendo regrada, de forma geral, pela Súmula n. 331 do TST; e a contratação temporária apenas pela Lei 6.019/1974.

O padrão do mundo do trabalho nos últimos dois séculos vem sendo de correspondência da relação econômica com a jurídica. As exceções são trabalho terceirizado e temporário.

A relação econômica formada no trabalho por conta alheia tem como elemento mais importante o fato de que o valor econômico do serviço realizado por aquele que vende sua força trabalho é aproveitado por quem recebe a atividade. A garantia de que haverá retribuição ocorre pelo potencial econômico do serviço realizado. O tomador do trabalho aproveita o serviço e parte do resultado econômico é repassado ao trabalhador na forma de salário. A essa relação econômica corresponde uma relação jurídica: a relação de emprego, instrumentalizada pelo contrato de emprego.

Terceirização e trabalho temporário rompem com essa imbricação e dissociam a relação econômica de trabalho da jurídica que lhe seria correspondente. A relação jurídica de emprego não é mais estabelecida com o tomador de trabalho, mas se utiliza de uma empresa “atravessadora” e o contrato com o tomador de serviços passa de trabalhista a civil.

Essa desassociação diminui as garantias econômicas de que o trabalho oferecido será contraprestado com o salário prometido. Por consequência, dois princípios basilares foram fixados pela jurisprudência nacional:

  1.   a) Máxima responsabilidade do tomador. O tomador de serviços é responsabilizado por inadimplementos do empregador (empresa de trabalho temporário ou terceirizado).
  2.   b) Mínima autorização. Como forma de manter a regra de correspondência entre relação econômica e jurídica e, assim, resguardar garantias de pagamento de salário e outras verbas, limita-se a terceirização a atividades meio e fixam-se condições restritivas de trabalho temporário.

A lei 13.429/2017 tende a não assegurar nem a regra de máxima responsabilidade do tomador, nem da limitação de autorização. Assim se verifica pela análise, adiante, de seus artigos.

  1. Comentários aos dispositivos alterados e acrescidos na Lei n. 6.019/1974

A lei 13.429/2017 altera dispositivos da Lei n. 6.019/74 e soma novos artigos.

Para facilitar a leitura, em tachado está a redação antiga e em negrito a nova, alterada pela lei em comento.

Art. 1º – É instituído o regime de trabalho temporário, nas condições estabelecidas na presente Lei.

Art. 1º – As relações de trabalho na empresa de trabalho temporário, na empresa de prestação de serviços e nas respectivas tomadoras de serviço e contratante regem-se por esta Lei.

A modificação de redação ocorre para esclarecer a alteração do objeto da Lei 6.019/1974, que passa de simples regulação de trabalho temporário para somar pretensão de oferecer regulação ampla também para a terceirização de serviços. Pode-se dizer que a Lei 6.019/1974 é agora a “Lei de Trabalho Arregimentado” ou “Lei de Intermediação do Trabalho”.

O artigo 1º faz referência a duas formas de organizações empresárias de intermediação de trabalho:

  1.   a) “empresa de trabalho temporário”: atua na arregimentação de trabalho temporário.
  2.   b) “empresa de prestação de serviços”: opera na terceirização de trabalho.

A essas soma-se o tomador de serviços. O empresário disposto a transferir para outrem parte de sua atividade tem as opções de terceirização e trabalho temporário, ambas com características diversas, mas regradas pelo mesmo diploma normativo.

A lei possui dispositivos apenas incidentes sobre trabalho temporário, apenas vinculados a terceirização de serviços e artigos que oferecem normatividade para ambas modalidades de trabalho arregimentado (por exemplo, arts. 19-A, 19-B e 19-C).

Art. 2º – Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviços.

Art. 2º – Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física contratada por uma empresa de trabalho temporário que a coloca à disposição de uma empresa tomadora de serviços, para atender à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços.

  • 1o É proibida a contratação de trabalho temporário para a substituição de trabalhadores em greve, salvo nos casos previstos em lei. 
  • 2o Considera-se complementar a demanda de serviços que seja oriunda de fatores imprevisíveis ou, quando decorrente de fatores previsíveis, tenha natureza intermitente, periódica ou sazonal.

O artigo 2º trata apenas de trabalho temporário. Mantém a ideia de que trabalho temporário é modalidade de pacto de atividade, de modo que apenas pode ser executado por pessoa natural. As empresas de trabalho temporário não podem ter seus quadros de trabalhadores constituídos por pessoas jurídicas, mas devem formalizar contratos especiais de emprego regidos pelas particularidades do serviço temporário.

No PL 6.787/2016 (Reforma Trabalhista) está presente possibilidade de contratação direta de trabalhadores temporários. Expressamente prevê hipótese de contrato temporário diretamente com tomador do serviço, sem intermediação de empresa de trabalho temporário.

A redação original de 1974 trazia duas hipóteses para a contratação temporária: a) substituição transitória de pessoal permanente (por exemplo substituição de funcionária em licença maternidade) e b) demanda complementar de serviços (exemplificativamente, para suprir necessidades produtivas sazonais, como ovos de páscoa).

O dispositivo mantém a primeira hipótese “substituição de pessoal regular e permanente” e no § 1º faz referência a possibilidade de tal ocorrer nas situações de greve. Todavia, apenas poderá haver contratação de temporários no lugar de grevistas quando lei específica assim dispuser. Nesse sentido, o art. 7º, parágrafo único da Lei n. 7.783/1989 veda rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas nos arts. 9º e 14.

Não há dúvidas de que eventual regulação do art. 2º, § 1º implicará redução prática no direito de greve e, consequentemente, restrição no poder de pressão de categoria que optar por paralisação. Acreditamos que o dispositivo não permite regulamentação desmedida. Apenas guardará constitucionalidade a regulação para hipótese de declaração judicial de abusividade do movimento paredista.

O PL 6.787/2016 (Reforma Trabalhista) explicita que temporário pode ser contratado para substituir empregado em afastamento previdenciário apenas pelo prazo de licença do permanente, limitado à data em que venha a ocorrer a concessão da aposentadoria por invalidez.

Alteração importante da Lei 13.429/2017 está na segunda circunstância autorizadora, que passa a ser “demanda complementar de serviços”.

A expressão utilizada aparenta intenção de ampliar as hipóteses de contratação temporária, mas soma forte carga de indeterminação. Chama atenção uma aparente alteração de espírito do elemento permissivo, relativizando a extraordinariedade.

Atualmente, a Instrução Normativa SIT n. 114/2014 disciplina a fiscalização do trabalho temporário e prevê no art. 2º, § 2º que “não se consideram extraordinários ou acréscimos de serviço comuns do ramo de negócio do tomador e que façam parte do risco do empreendimento, bem como os decorrentes do crescimento da empresa, da expansão de seus negócios ou da abertura de filiais.”

A nova redação do art. 2º da Lei 6.019/1974 estabelece que a “demanda complementar de serviços” tem vez em duas situações alternativas: a) fatores imprevisíveis; b) quando decorrente de fatores previsíveis, tenha natureza intermitente, periódica ou sazonal.

A grande alteração está nessa segunda hipótese, oriunda de fatores previsíveis. O antigo “acréscimo extraordinário de serviços” costuma ser inserido como hipótese imprevista pelo empresário e, portanto, autorizador da efetivação e contratação extraordinária equivalente, na forma de trabalho temporário.

A “demanda complementar decorrente de fator previsível” é de mais difícil inserção no conceito de situação extraordinária original. A ocorrência de serviços usuais, mas em volume extraordinário, faz parte do risco de negócio, de modo que não cabe (ou não cabia) a transferência do risco do empreendimento à força de trabalho, com contratação precária na forma de temporários.

O conceito, como se vê, segue altamente indeterminado e, fatalmente, gerará insegurança jurídica.

O PL 6.787/2016 (Reforma Trabalhista) mantém a primitiva expressão “acréscimo extraordinário de serviços”, mas introduz § 1º para esclarecer que esse ocorre por alteração sazonal da demanda por produtos e serviços.

Art. 4º – Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos.

Art. 4º – Empresa de trabalho temporário é a pessoa jurídica, devidamente registrada no Ministério do Trabalho, responsável pela colocação de trabalhadores à disposição de outras empresas temporariamente.

A redação atual do art. 4º esclarece que a empresa de trabalho temporário deve ser constituída na forma de pessoa jurídica assim regularizada junto ao Ministério do Trabalho. Para atuação no mercado de arregimentação de trabalho temporário não basta a regularização ordinária da pessoa jurídica, mas a integração em critérios e cadastro próprio do Ministério do Trabalho.

Eventual possibilidade de pessoa natural ser arregimentadora de trabalho temporário fatalmente seria fator de aumento de insegurança econômica, informalidade e chamada à ampliação de inadimplementos descobertos de patrimônio. A obrigatoriedade de constituição de pessoa jurídica imprime, portanto, maior segurança.

A ampliação ocorre no campo de atuação das empresas de trabalho temporário, incluindo-se atividade rural. Na mensagem do Presidente da República n. 344/1998, justificou-se a ampliação com afirmação de “frágil desenvolvimento tecnológico e a restrição de direitos que caracterizavam o meio rural viabilizavam a adoção do trabalho temporário apenas no meio urbano.”

Ausente expressa menção, compreendemos que a Lei 6.019/1974 não se aplica ao trabalho doméstico. A explicitação dessa exclusão está presente no PL 6.787/2016.

No PLC 30/2015, objetivamente exclui-se do âmbito de terceirização os contratos no âmbito da Administração pública direta, autárquica e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A ausência de esclarecimento análogo na Lei n. 13.429/2017 tende a criar ainda maiores dificuldades de interpretação da extensão de sua atuação. Mantém-se vigente o Decreto-Lei n. 200/1967, determinante da terceirização essencialmente na atividade meio.

Inusitada modificação ocorreu com a exclusão de esclarecimento na redação original de que os trabalhadores devem ser “devidamente qualificados” e “remunerados e assistidos” pela empresa de trabalho temporário.

Na mensagem n. 344 de 1998 que acompanhou o então projeto de lei, registrou-se:

10} O conceito de trabalhador temporário fica igualmente ampliado, subtraindo-se dele a expressão “devidamente qualificado·, o que afastará interpretações restritivas quanto ao tipo de trabalhador que pode ser objeto de contratação temporária (art. 4º).

Pensamos, todavia, que determinantes intrínsecos seguem presentes no conceito de trabalho temporário. Os trabalhadores temporários realizam atividades específicas e, portanto, devem possuir qualificação profissional própria e clara.

Na qualidade de empregadora, a empresa de trabalho temporário é a responsável por pagamento de salários, bem como oferecimento e entrega de benefícios, como vale transporte e auxílio alimentação. A empresa tomadora de serviços tem a prerrogativa da subordinação direta, mas não de pagamento de salários, nem oferecimento de outras parcelas de natureza econômica ao funcionário temporário.

Art. 4o-A. Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos.     

  • 1o  A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços.       
  • 2o  Não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.

Esse é o dispositivo que implicará maior divergência jurisprudencial e doutrinária. Destina-se a indicar o âmbito de atividades de uma tomadora de serviços que pode ser suprido por trabalhadores terceirizados. Deve-se atentar que o art. 4º-A relaciona-se a uma única espécie de trabalho intermediado, qual seja, a terceirização de serviços.

Conforme esclarecido na nova redação do art. 1º, o objeto da Lei 6.019/1974 passa de simples regulação de trabalho temporário para somar regulação ampla também para a terceirização de serviços. Ao se utilizar da expressão “empresa prestadora de serviços”, o caput do art. 4º-A já esclarece que visa regular apenas a modalidade terceirização de trabalho arregimentado.

A ausência de regulação legal para terceirização fez desenvolver em doutrina e jurisprudência diferenciação entre atividade fim e atividade meio. Assim, o entendimento consubstanciado na súmula n. 331 do TST é de que a regularidade da terceirização depende da classificação das atividades como meio.

Em poucas palavras, atividade meio é toda aquela que se coloca afastada do objetivo principal da empresas. São os serviços tidos como ordinariamente necessários, mas sem relação direta com a atividade principal do empreendimento; atividade fim toca no objetivo essencial, a destinação da empresa, expressa em seu contrato social.

O conceito de atividade fim está também ligado à viabilidade econômica e administrativa do empreendimento. Eventual delegação a terceiros de áreas vitais à empresa colocariam em risco o próprio poder de administração.

O art. 4º-A não se utiliza da dicotomia atividade-fim x atividade-meio, mas afirma que a empresa prestadora deve realizar serviços determinados e específicos. A expressão “serviços determinados e específicos” não se confunde nem com atividade-fim, nem com atividade-meio. A lei não ingressa nessa seara e prefere apenas pontuar a impossibilidade de contratação de empresa de trabalho temporário para atividades inespecíficas. A regra a ser retirada é de que a contratação temporária deve ter objeto certo, relacionar setores da empresa tomadora em que atuarão os funcionários terceirizados e quais as atividades que esses deverão desenvolver.

O art. 5º-B reforça nosso entendimento, indicando os elementos necessários para identificar determinação e especificidade dos serviços terceirizados contratados.

No PLC 30/2015 opta-se, sem dúvida, por permitir terceirização em atividade-fim da empresa tomadora. O projeto de lei demonstra sua opção a partir dos conceitos de contratante e contratada, incisos II e III do art. 2º. Estabelece como contratante “a pessoa jurídica que celebra contrato de prestação de serviços determinados, específicos e relacionados a parcela de qualquer de suas atividades com empresa especializada na prestação dos serviços contratados, nos locais determinados no contrato ou em seus aditivos” (grifei). Segue a explicitação, relacionando como entidades contratadas “as associações, sociedades, fundações e empresas individuais que sejam especializadas e que prestem serviços determinados e específicos relacionados a parcela de qualquer atividade da contratante e que possuam qualificação técnica para a prestação do serviço contratado e capacidade econômica compatível com a sua execução.” (grifei).

No PL 6.442/2016 também está explicitado que empregador rural poderá terceirizar atividade fim:

Art. 27. É facultado ao empregador rural a contratação com pessoas físicas ou jurídicas para execução de sua atividade fim, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

Diferente de suas congêneres, o projeto que resultou na Lei 13.429/2017 optou pelo significativo caminho de rejeitar o conceito “atividade fim”.

Já foi dito acima que o trabalho arregimentado é exceção ao modo de organização do trabalho, de modo que as hipóteses de sua utilização não são auto evidentes, mas necessitam de previsão normativa. Repisa-se que a Lei n. 6019/1974 passa a ter duplo objeto (trabalho temporário e terceirizado), de modo que deve ser lida em um diálogo de sistematicidade e compartimentação.

O parecer do relator do Deputado Jair Meneguelli, na CTPASP da Câmara dos Deputados, para o então projeto legislativo que resultou na Lei 13.429/2017, expresssamente registra que “as atividades desenvolvidas pela prestadora e contratante de serviços são necessariamente distintas”. Não há, portanto, como a empresa terceirizada ter o mesmo objeto finalístico da empresa tomadora dos serviços.

O art. 9º do mesmo diploma esclarece que o trabalho temporário é realizado também em atividades-fim da empresa. O outro trabalho arregimentado objeto da lei – a terceirização – não guarda no texto normatizado a mesma expressão, sinalizando que não é cabível a aceitação de sua utilização. A previsão expressa de que o trabalho temporário pode atuar em atividades-fim da prestadora, e o silêncio a respeito do trabalho terceirizado, assinala que não há incidência dessa excepcionalidade. Não é cabível trabalho terceirizado em atividades-fim, conforme compreensão ainda válida da Súmula n. 331 do TST.

A chamada quarteirização está prevista no § 1º, permitindo-se que uma empresa contratada para realizar serviços terceirizados “repasse” a integralidade ou parte da mesma atividade para outra empresa. A terceirização no Brasil visa essencialmente a redução de custos e cada intermediário do trabalho tende a garantir sua lucratividade a partir da redução das despesas com seus funcionários. A Lei n. 13.429/2017 institucionaliza a prática conhecida por prejudicar trabalhadores a partir do achatamento de salário e pulverização da referência de empregador.

Havendo quarteirização de serviços, ou seja, a transferência da prestação de serviços contratada para outra empresa (quarteirizada), empregadora dos trabalhadores prejudicados por inadimplemento trabalhista, todos os beneficiários da cadeia produtiva respondem subsidiariamente. Ou seja, empresa tomadora cliente dos serviços e terceirizada original são responsáveis subsidiárias junto a quarteirizada.

Art. 5º – O funcionamento da empresa de trabalho temporário dependerá de registro no Departamento Nacional de Mão-de-Obra do Ministério do Trabalho e Previdência Social.

Art. 5o  Empresa tomadora de serviços é a pessoa jurídica ou entidade a ela equiparada que celebra contrato de prestação de trabalho temporário com a empresa definida no art. 4o desta Lei. 

O requisito de inscrição da empresa de trabalho temporário em cadastro do Ministério do Trabalho permanece, mas foi deslocado para o atual artigo 4º da Lei 6.019/1974.

A atual redação do art. 5º refere-se unicamente a terceirização de serviços e visa oferecer conceito à empresa tomadora. O art. 2º, § 2º da CLT elastece o conceito de empregador, incorporando pessoas e entidades sem finalidades lucrativas, como associações recreativas e de beneficência. O dispositivo em comento segue essa linha e permite que entidades que não visam lucro também possam se utilizar de trabalho temporário.

Art. 5o-A.  Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços determinados e específicos.     

  • 1o  É vedada à contratante a utilização dos trabalhadores em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços.  
  • 2o  Os serviços contratados poderão ser executados nas instalações físicas da empresa contratante ou em outro local, de comum acordo entre as partes.    
  • 3o  É responsabilidade da contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato.
  • 4o  A contratante poderá estender ao trabalhador da empresa de prestação de serviços o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas dependências da contratante, ou local por ela designado.      
  • 5o  A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.

O dispositivo refere-se apenas a terceirização de serviços.

Seguindo elementos do art. 4º-A, define-se que a terceirização lícita deve ocorrer em serviços determinados e específicos. Ou seja, veda contratação de serviços terceirizados inespecíficos, sem expressa indicação dos setores da empresa tomadora em que irão trabalhar funcionários terceirizados. A regra de especificação dos serviços e setores de trabalho terceirizado é realçada no caput e § 1º do art. 5º-A.

Conforme fixado no § 2º, a terceirização pode ocorrer tanto na sede da empresa tomadora, como em outras localidades. Não há vedação, por exemplo, para a pactuação de terceirização de serviço de call center a ser desenvolvido nas dependências da empresa de prestação de serviços. Também se admite que o trabalho terceirizado possa ocorrer na residência do trabalhor terceirizado, como em situações de tele trabalho.

O tomador de serviços terceirizados possui responsabilidade por higiene e segurança e salubridade do ambiente de trabalho, tanto no serviço realizado em suas próprias dependências, como em outro definido no contrato de terceirização (§ 3º).

No PLC 30/2015, aos terceirizados são asseguradas mesmas condições relativas a alimentação, treinamento, transporte, atendimento médico e ambulatorial, bem como medidas de saúde e segurança.

Proposições e debates ocorreram no Parlamento visando garantir plena correspondência de direitos entre trabalhadores diretos do tomador e terceirizados. O § 4º mostra que apenas houve acordo expresso de possibilidade do tomador oferecer aos terceirizados as mesmas condições que disponibiliza a seus empregados. Não há, todavia, obrigatoriedade.

Também segue indefinida na lei a importante questão enfrentada pela jurisprudência de obrigação de pagamento de idêntico salário entre terceirizados e trabalhadores diretos que realizam o mesmo serviço na empresa tomadora. A necessidade de tratamento isonômico pleno entre arregimentados e trabalhadores diretos vem explicitado na Lei n. 6.019, art. 12, desde 1974 e foi mantido apenas para temporários.

Deve-se atentar que o projeto de lei aprovado no Parlamento revogava todas as alíneas do art. 12, estabelecendo apenas garantia de salário e jornada equivalentes. O veto presidencial registrou que “não há razão lógica ou jurídica para o dispositivo, já que os direitos elencados nas alíneas ‘a’ a ‘h’ estão assegurados na Constituição, em seu artigo 7o, não se configurando adequada a proposta que admita limitação a esses direitos, recomendando-se sua manutenção”.

A jurisprudência nacional vem compreendendo majoritariamente que equiparação salarial entre terceirizados e trabalhadores diretos do tomador apenas é possível em caso de terceirização ilícita. Jurisprudência minoritária, todavia, avança no sentido de possibilidade de equiparação entre esses trabalhadores também em terceirização lícita, a partir de idéia de tratamento isonômico. Costumam ser manejados fundamentos jurídicos baseados no art. XXIII da Declaração Universal dos Direitos Humanos, arts. 5º e 7º, XXX da CRFB/88 e aplicação extensiva do art. 12 da Lei 6.019/1974.  O TST, por meio da O. J. n. 383 da SDI compreende a necessidade de isonomia entre empregados da empresa prestadora de serviços e da tomadora.

O § 5º mantém o entendimento da Súmula n. 331 de responsabilidade subsidiária do tomador de serviços durante o período de trabalho. O art. 31 da Lei n. 8.212/1991 prevê que a empresa contratante de serviços executados mediante cessão de mão de obra, inclusive em regime de trabalho temporário, deverá reter 11% do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher, em nome da empresa cedente da mão de obra.

Há previsão de responsabilidade solidária do contratante no PLC 30/2015, mas limitada a salário em sentido amplo, férias, vale transporte, FGTS e previdência social.

Art. 5o-B.  O contrato de prestação de serviços conterá:     

I – qualificação das partes;
II – especificação do serviço a ser prestado;   

III – prazo para realização do serviço, quando for o caso;
IV – valor.

O art. 5º-B, detalha a obrigação genérica do art. 5º-A de que o serviço terceirizado deve ser determinado e específico. Nosso entendimento é de que essa expressão nada tem a ver com a dicotomia atividade fim x atividade meio e o dispositivo em comento indica os elementos necessários para aferir determinação e especificidade do contrato de prestação de serviços terceirizados.

Art. 6º – O pedido de registro para funcionar deverá ser instruído com os seguintes documentos:
a) prova de constituição da firma e de nacionalidade brasileira de seus sócios, com o competente registro na Junta Comercial da localidade em que tenha sede;
b) prova de possuir capital social de no mínimo quinhentas vezes o valor do maior salário mínimo vigente no País;
c) prova de entrega da relação de trabalhadores a que se refere o art. 360, da Consolidação as Leis do Trabalho, bem como apresentação do Certificado de Regularidade de Situação, fornecido pelo Instituto Nacional de Previdência Social;

d) prova de recolhimento da Contribuição Sindical;
e) prova da propriedade do imóvel-sede ou recibo referente ao último mês, relativo ao contrato de locação;
f) prova de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda.

Art. 6o  São requisitos para funcionamento e registro da empresa de trabalho temporário no Ministério do Trabalho:     

I – prova de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), do Ministério da Fazenda;     

II – prova do competente registro na Junta Comercial da localidade em que tenha sede;      

III – prova de possuir capital social de, no mínimo, R$ 100.000,00 (cem mil reais).      

Parágrafo único. No caso de mudança de sede ou de abertura de filiais, agências ou escritórios é dispensada a apresentação dos documentos de que trata este artigo, exigindo-se, no entanto, o encaminhamento prévio ao Departamento Nacional de Mão-de-Obra de comunicação por escrito, com justificativa e endereço da nova sede ou das unidades operacionais da empresa.

O art. 6º trata exclusivamente de elementos obrigatórios para funcionamento de empresa de trabalho temporário.

Imposição de registro no Ministério do Trabalho também está no art. 4º da Lei 6.019/1974.

A Lei 13.429/2017 subtraiu requisitos de constituição e funcionamento das empresas de trabalho temporário, precarizando mecanismo de garantias econômicas para cumprimento de suas obrigações. Nacionalidade brasileira dos sócios, capital social elevado, certidões de regularidade de obrigações e imóvel próprio estavam previstos no art. 6º e foram excluídos.

É bastante comum o inadimplemento de obrigações trabalhistas por parte de empresas de trabalho temporário. A diminuição de garantias de patrimônio para fazer frente às dívidas tende a dificultar ainda mais execuções de sentenças.

Caminho diferente toma o PL 6.787/2016, pois estabelece obrigação das empresas de trabalho temporário fornecer às tomadoras comprovante de regularidade junto ao INSS, recolhimentos de FGTS e Negativa de Débitos junto à Receita Federal, sob pena de retenção dos valores devidos no contrato.

Art. 9º – O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora de serviço ou cliente deverá ser obrigatoriamente escrito e dele deverá constar expressamente o motivo justificador da demanda de trabalho temporário, assim como as modalidades de remuneração da prestação de serviço.

Art. 9o  O contrato celebrado pela empresa de trabalho temporário e a tomadora de serviços será por escrito, ficará à disposição da autoridade fiscalizadora no estabelecimento da tomadora de serviços e conterá:     

I – qualificação das partes;     

II – motivo justificador da demanda de trabalho temporário;     

III – prazo da prestação de serviços;    

IV – valor da prestação de serviços;   

V – disposições sobre a segurança e a saúde do trabalhador, independentemente do local de realização do trabalho.      

  • 1o  É responsabilidade da empresa contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou em local por ela designado.     
  • 2o  A contratante estenderá ao trabalhador da empresa de trabalho temporário o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas dependências da contratante, ou local por ela designado.     
  • 3o  O contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços.     

O contrato firmado entre empresa de trabalho temporário e tomador de serviços mantém obrigação de forma escrita. Os requisitos de especificação e valor do serviço seguem vigentes à relação, mas estabelecidos no art. 5º-B.

A regra do art. 9º, § 1º segue o previsto no art. 5º-A, § 3º.

No trabalho terceirizado, formalmente, há apenas faculdade de extensão ao trabalhador arregimentado as mesmas condições de tratamento médico, ambulatorial e de refeição (art. 5º-A, § 4º). O § 2º do art. 9º, todavia, informa que para o trabalho temporário há obrigatoriedade de garantia de mesmas condições nesses elementos.

Mantém-se vigente o art. 12 da Lei 6.019/1974, o qual assegura ao trabalhador temporário remuneração equivalente à percebida pelos empregados de mesma categoria da empresa tomadora ou cliente, calculados à base horária.

No PL 6.787/2016, explicita-se que ficam assegurados ao trabalhador temporário os mesmos direitos previstos na CLT relativos aos contratos por prazo determinado.

Não há qualquer novidade na possibilidade do trabalho temporário ter por objeto atividades-fim da empresa tomadora (§ 3º).

O art. 2º da Lei n. 6.019/1974 traz dois requisitos de contratação temporária: necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços. Apesar de não mais haver explicitação dos motivos da contratação, entendemos que segue como elemento obrigatório para verificação da regularidade do pacto temporário.

Art. 10 – O contrato entre a empresa de trabalho temporário e a empresa tomadora ou cliente, com relação a um mesmo empregado, não poderá exceder de três meses, salvo autorização conferida pelo órgão local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, segundo instruções a serem baixadas pelo Departamento Nacional de Mão-de-Obra.

Art. 10.  Qualquer que seja o ramo da empresa tomadora de serviços, não existe vínculo de emprego entre ela e os trabalhadores contratados pelas empresas de trabalho temporário.      

  • 1o  O contrato de trabalho temporário, com relação ao mesmo empregador, não poderá exceder ao prazo de cento e oitenta dias, consecutivos ou não.      
  • 2o  O contrato poderá ser prorrogado por até noventa dias, consecutivos ou não, além do prazo estabelecido no § 1o deste artigo, quando comprovada a manutenção das condições que o ensejaram.      
  • 3o  (VETADO).     
  • 4o  Não se aplica ao trabalhador temporário, contratado pela tomadora de serviços, o contrato de experiência previsto no parágrafo único do art. 445 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1o de maio de 1943.      
  • 5o  O trabalhador temporário que cumprir o período estipulado nos §§ 1o e 2o deste artigo somente poderá ser colocado à disposição da mesma tomadora de serviços em novo contrato temporário, após noventa dias do término do contrato anterior.
  • 6o A contratação anterior ao prazo previsto no § 5o deste artigo caracteriza vínculo empregatício com a tomadora. 
  • 7o A contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer o trabalho temporário, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.     

O caput do art. 10 traz regra parecida com a do art. 442, parágrafo único, da CLT: não há vínculo emprego entre trabalhador cooperativado e cooperativa ou entidade tomadora dos serviços, desde que, no plano fático, não se identifiquem elementos de vínculo de emprego. Do mesmo modo, ausência de vínculo de emprego direto entre empregados temporários e tomadores de serviços depende do cumprimento dos requisitos estabelecidos na Lei 6.019/1974 para a regularidade do trabalho temporário.

No PLC 30/2015 há maior clareza, referindo no art. 4º que não se configurando vínculo de emprego entre a contratante e os empregados da contratada, exceto se verificados os requisitos previstos nos arts. 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

Os prazos do contrato de trabalho temporário deixam de ser fixados com o módulo “mês” e integram a contagem por dias, o que facilitará bastante a verificação de regularidade.

O prazo original do contrato temporário era de até 3 meses, salvo autorização do Ministério do Trabalho. A Lei n. 13.429/2017 promove notável ampliação, estabelecendo que pode chegar a 180 dias, consecutivos ou não. Pode, ainda, ser prorrogado por mais 90 dias, independentemente de autorização administrativa, mas desde que mantidos os motivos que determinaram a pactuação.

No PL 6787/2016 busca-se ampliação para até 120 dias, com possibilidade de uma única prorrogação, por período não superior ao inicialmente estipulado. Não há condicionante de autorização administrativa.

A grande ampliação do prazo causa dois problemas de compatibilização sistêmica: a) relativiza a compreensão de que risco do empreendimento deve ser suportado pelo empregador, sem que precise recorrer a pactos excepcionais e precarizados; b) relativiza a própria idéia de limitação temporal do trabalho temporário.

Não há como se verificar permanência dos motivos da pactuação por prazo determinado sem que tenha sido previamente fixado no pacto entre as empresas de trabalho temporário e tomadora. Apesar do requisito ter sido excluído do art. 9º, permanece presente.

O § 3º previa que “o prazo previsto neste artigo poderá ser alterado mediante acordo ou convenção coletiva”. Não estabelecia qualquer limitação ou condicionante para ampliação de prazo, podendo gerar plena desnaturação da excepcionalidade do pacto. A possibilidade de norma coletiva produzir regra prejudicial ao previsto na lei depende de alteração na legislação nacional e é objeto do controvertido PL 6.787/2016. O veto presidencial registrou “Não se configura adequada a possibilidade de alteração do prazo máximo do contrato de trabalho temporário, de modo a evitar-se conflito entre esse regime contratual e o contrato por tempo indeterminado, preservando-se assim a segurança jurídica de ambas modalidades de contratação.”

A impossibilidade de contratação por experiência está explícita no § 4º e já era reconhecida pela jurisprudência. Nesse sentido o julgamento do RR 184500-06.2009.5.02.0262.

Os parágrafos 5º e 6º estabelecem restrições para novas contratações temporárias de um mesmo trabalhador. Note-se que mesmo a alteração dos motivos (necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços) são insuficientes e, caso descumprindo, ensejarão reconhecimento de vínculo de emprego direto entre o empregado e a empresa tomadora, a partir da segunda contratação.

No PL 6787/2016, prevê-se que, uma vez encerrado o contrato temporário, não poderá a empresa tomadora celebrar outro contrato temporário com o mesmo trabalhador, seja de maneira direta, seja por meio de empresa de trabalho temporário pelo período de 120 dias, ou pelo prazo do contrato, se inferior a 120 dias.

Mantendo-se a regra fixada na Súmula n. 331 para terceirização, a empresa tomadora de serviço temporário é responsável subsidiária por obrigações trabalhistas do funcionário temporário. No PL 6.787/2016 também foi mantida a responsabilidade subsidiária da tomadora de serviços por obrigações trabalhistas e previdenciárias.

Atente-se que não houve revogação do art. 16 da Lei n. 6.019/1974, de modo que, no caso de falência da empresa de trabalho temporário, a empresa tomadora ou cliente é solidariamente responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias e verbas trabalhistas. Acreditamos que, em interpretação extensiva e seguindo a nova sistematicidade e amplitude da lei, é possível a responsabilização solidária de tomador de serviços no caso de falência empresa de trabalho terceirizado.

 

Art. 19-A.  O descumprimento do disposto nesta Lei sujeita a empresa infratora ao pagamento de multa.     

Parágrafo único.  A fiscalização, a autuação e o processo de imposição das multas reger-se-ão pelo Título VII da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo 

A Lei n. 7.855/1989, art. 3º, III fixa multa em 160 BTNs por trabalhador. O valor é irrisório e não costuma ser suficiente para reprimir com eficiência o amplo ambiente nacional de descumprimento da legislação trabalhista.

O Título VII da CLT trata do processo de multas administrativas, arts. 626 a 642-A. Incumbe ao auditor fiscal do trabalho averiguar cumprimento das normas e aplicar as multas.

Art. 19-B.  O disposto nesta Lei não se aplica às empresas de vigilância e transporte de valores, permanecendo as respectivas relações de trabalho reguladas por legislação especial, e subsidiariamente pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943.

As empresas de vigilância e transporte de valores possuem regramento específico e que se mantém vigente para suas atividades. Essa modalidade de intermediação de trabalho seguem com aplicação do estabelecido no Decreto-Lei n. 5.452/1943.

Compreendemos que a Lei 6.019/1974 trata-se de diploma geral e, excepcionalmente, pode ser aplicada para intermediação de vigilância e transporte de valores, em interpretação extensiva, sempre que o regramento específico for insuficiente e a lei geral não conflitar.

Art. 19-C. Os contratos em vigência, se as partes assim acordarem, poderão ser adequados aos termos desta Lei.    

Trata-se de regra de transição e que visa permitir, no curso de relações de intermediação de trabalho, adequação ao normativo em vigência. O art. 19-C não estabelece qualquer previsão de efeitos ou lei aplicável para relações em curso sem opção de adaptação à nova lei.

Pensamos que a regra de inalterabilidade lesiva, inerente ao Direito do Trabalho, e instrumentalizada no art. 468 da CLT, não pode ser relativizada pelo art. 19-C da Lei n. 6.019/1974. O dispositivo da Consolidação estabelece a regra geral de que cláusulas do contrato de emprego não podem ser alteradas para fixar piores condições gerais de trabalho. Essa limitação somente é afastada nas expressas hipóteses legais e nos casos de flexibilização facultada pela Constituição Federal, mediante convenção ou acordo coletivo. A licitude das alterações está condicionada ao mútuo consentimento e ausência de prejuízos ao empregado, diretos ou indiretos.

Portanto, o ambiente de adequação oferecido pelo art. 19-C está limitado ao espaço que não importe piora das condições originárias.

  1. Conclusões 

As conclusões não podem se manter na simplicidade auto evidente da necessidade nacional de uma legislação mais clara para regras de terceirização, mas em análise sobre a adequação do que foi oferecido.

Trabalhadores temporários e terceirizados já possuem desvantagens em relação aos empregados diretos. Diversos estudos estatísticos demonstram que esses operários recebem salários menores, ficam mais tempo desempregados e têm maiores índices de acidentes laborais. A Lei 13.429/2017, transformadora da Lei n. 6.019/1974 no diploma geral de arregimentação de trabalho no Brasil, tende a ampliar esse quadro e não oferece melhores condições de serviço, nem de garantias à satisfação dos históricos inadimplementos causados pelas empresas de trabalho temporário e terceirizado.

Também não há perspectivas de oferecimento de maior segurança jurídica em curto ou médio prazo. A lei inaugura novos conceitos indeterminados e não esclarece a exata extensão de direitos assegurados aos já precarizados trabalhadores terceirizados e temporários em relação aos empregados diretos do tomador de serviços. Muito menos apresenta solução prática para os milhares de contratos em curso.

O ambiente de insegurança é reforçado pelo avanço de outros projetos legislativos que atuam na mesma área de trabalho terceirizado e temporário. Esses projetos não se mostram nem asseguradores de direitos nem atuam na orientação constitucional de avanço do Direito do Trabalho.

Soma-se a perspectiva de discussão judicial sobre validade do processo legislativo que levou à Lei 13.429/2017 e as já profundas divergências acadêmicas sobre a extensão das alterações – que levarão a não menos intensas diferenças jurisdicionais.

Mais uma vez, apresenta-se à magistratura trabalhista a difícil tarefa de oferecer algum esclarecimento nos anos que virão.

http://www.amatra4.org.br/publicacoes/artigos/1235-lei-13-429-de-2017-e-a-intermediacao-de-trabalho-no-brasil-perspectivas-politicas-e-hermeneuticas

 

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