Fusão do Judiciário da União: gourmetizaram o nonsense
Fusão do Judiciário da União: gourmetizaram o nonsense
Rodrigo Trindade
Falar de extinção da Justiça do Trabalho é como a rotina do feijão de minha infância: produzido na segunda, ia sendo requentado até o final da semana. Agora, tentando parecer menos ridícula que a ideia original, aparece repaginada com a opção “fusão com a Justiça Federal”. Gourmetizaram o devaneio.
E vem de carcomido livro de receitas. O discurso foi corrente nos anos 1990, quando senador decadente labutou na mesma bravata extintiva. E obteve exatamente o contrário: com a Reforma do Judiciário, os trabalhistas ganharam novos cargos e mais uma dúzia de atribuições.
Pensar em jogar a Justiça do Trabalho dentro da Federal é desconhecer tanto atribuições jurisdicionais básicas, como não ter o menor conhecimento de proporção.
Exército e Marinha também são órgãos federais, mais ninguém cogita de unifica-los. Afinal, contam com missões e instrumentos diferentes, apesar de serem constituídos por corpo profissional de formação muito semelhante.
O mesmo ocorre com os órgãos de jurisdição. A Federal lida, essencialmente, com questões tributárias e da administração pública, com forte tendência de massificação. Há praticamente um único réu – a União, com todos os poderes e privilégios próprios da prevalência do interesse público. Os juízos trabalhistas seguem realidade quase oposta e resolvem relações privadas, a partir de normas profundamente individualizadas às realidades de cada relação de trabalho. Para isso, aplicam uma infinidade de regras legais, contratuais e de convenções coletivas, buscando pacificar a quase sempre conflituosa relação entre capital e trabalho.
A profunda diferença de atribuições e significados institucionais reflete na estrutura. A trabalhista conta com mais processos, magistrados, varas e tribunais que a coirmã. Colocar a maior dentro da menor é fisicamente impraticável, algo como pensar no Uruguai incorporando o Brasil.
É preciso ir além das bravatas, da repetição acrítica e da fuga às perguntas corretas.
Existe algum estudo? Há Projeto de Emenda Constitucional tramitando? Algum ministro de tribunal superior defende? Alguma associação de magistrados vê possibilidade?
A resposta para tudo isso é não.
Antes de embarcar em espiral paranoica, não seria melhor atentar de onde vêm as sugestões nonsense?
Se há algo que deve ser extinto é a cultura de evitar cumprimento voluntário das obrigações e achar que tudo é possível até que alguém de toga ordene, sob pena de pesar no bolso. Enquanto esse problema não for resolvido, nem matar o médico, nem juntar os leitos hospitalares, servirão para salvar os pacientes.
Excelente artigo! Madura reflexão…