Justiça do Trabalho manda cessar reuniões-comício em rede de lojas de SC

Justiça do Trabalho manda cessar reuniões-comício em rede de lojas de SC

Rodrigo Trindade

Um dia após vídeo de reunião-comício em rede de lojas de Santa Catarina varrer as redes sociais, despacho do juiz da 7ª Vara do Trabalho de Florianópolis, Dr. Carlos Alberto Pereira de Castro, manda que cessem as práticas de admoestação política de empregados. O despacho foi proferido nos autos de ação ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho.

A iniciativa do MPT teve origem em “ato cívico” realizado pelo proprietário da rede, no qual todos os empregados da administração foram obrigados a participar. O ato foi filmado e amplamente divulgado
(https://www.facebook.com/LucianoHangOficial/videos/2159029844417622/?fref=gs&dti=2205327913074430&hc_location=group)

Em seu despacho, o magistrado registrou que “o tom da fala do réu aponta no sentido de uma conduta flagrantemente amedrontadora de seus empregados, impositiva de suas ideias quanto à pessoa do candidato que eles deveriam apoiar e eleger”. Também registrou que a prática liga-se à prática histórica do chamado “voto de cabresto”, originário do início da República e que significa a tentativa – muitas vezes bem sucedida – de impor a grupos de pessoas a escolha política ditada por uma pessoa dotada de maior poderio dentro de certas comunidades. Segundo o juiz, a reunião na empresa serviu para fazer os funcionários de “claque” para o candidato do proprietário.

Liminar para abstenção e publicação da decisão

O juízo da 7ª Vara de Florianópolis ordenou que cessem as reuniões-comício e deixem os diretores da empresa de coagir, admoestar ou influenciar os votos de seus funcionários. Também determinou que não sejam realizadas manifestações políticas a favor ou desfavor de qualquer candidato ou partido político. Por fim, para conhecimento da decisão, estabeleceu direito de resposta, de modo a ser dada ampla divulgação da decisão. Para tanto, em até 24 horas da ciência da decisão judicial, a empresa deverá fazer outro vídeo em todas as suas redes sociais, tendo como teor a fiel leitura da decisão judicial concessiva da liminar.

Para o caso da empresa seguir com as condutas reprimidas na decisão, foi estabelecida multa de R$ 500.000,00.

Cabe recurso da decisão.

Íntegra da decisão

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 12ª REGIÃO
7ª VARA DO TRABALHO DE FLORIANÓPOLIS
TutAntAnt 0001129-41.2018.5.12.0037
REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
REQUERIDO: HAVAN LOJAS DE DEPARTAMENTOS LTDA, LUCIANO HANG

Vistos, etc…

RELATÓRIO

O Ministério Público do Trabalho, autor da presente, requer, liminarmente, a concessão de tutela de urgência antecipatória, de maneira antecedente, para o fim de condenação dos réus nas seguintes obrigações:

1 – abstenção, imediatamente, por si ou por seus prepostos, de adotar quaisquer condutas que, por meio de assédio moral, discriminação, violação da intimidade ou abuso de poder diretivo, intentem coagir, intimidar, admoestar e/ou influenciar o voto de quaisquer de seus empregados à Presidência da República no próximo domingo, dia 07/10/2018 e, se houver segundo turno, no dia 28/10/2018;

2 – abstenção, imediatamente, por si ou por seus prepostos, a não obrigar, exigir, impor, induzir ou pressionar trabalhadores para realização de qualquer atividade ou manifestação política em favor ou desfavor a qualquer candidato ou partido político;

3 – abstenção, imediatamente, por si ou por seus prepostos, de realizar pesquisas de intenção de voto entre seus empregados;

4 – divulgação , em até 24 horas da ciência da decisão judicial concessiva da liminar ora requerida o seu inteiro teor, a todas lojas e unidades administrativas da rede no Brasil, afixando-se cópia da integralidade da decisão judicial no quadro de aviso de todas as unidades lojistas e administrativas, de modo a cientificar os empregados quanto ao seu direito de escolher livremente candidatos a cargos eletivos, bem como quanto à impossibilidade e ilegalidade de se realizar campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo, intimidando, admoestando ou influenciando o voto de seus empregados, com abuso de poder diretivo.

5 – veiculação, em até 24 horas da ciência da decisão judicial concessiva da liminar ora requerida, vídeo em todas as redes sociais dos Réus, cujo teor deve restringir-se à fiel leitura da decisão judicial concessiva da liminar ora requerida, de modo a cientificar os empregados quanto ao seu direito de escolher livremente candidatos a cargos eletivos, bem como quanto à impossibilidade e ilegalidade de se realizar campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo, intimidando, admoestando ou influenciando o voto de seus empregados, com abuso de poder diretivo;

6 – assegurar a veiculação do direito de resposta da coletividade representada pelo Ministério Público do Trabalho, qual seja, a coletividade de trabalhadores prejudicados, às expensas dos réus, em pelo menos três canais de grande audiência da rede nacional, em horário nobre, por pelo menos três dias até as eleições presidenciais, com o seguinte teor ou com teor semelhante a ser definido por este r. juízo: “Atenção: A Havan e seu proprietário, Luciano Hang, em cumprimento à DECISÃO JUDICIAL proferida na Ação Cautelar n. (…), ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, vêm a público afirmar o direito de seus empregados livremente escolherem seus candidatos nas eleições que ocorrerão neste domingo, independente do partido ou ideologia política, garantindo a todos os seus funcionários que não serão tomadas medidas de caráter retaliatório, como a perda de empregos, caso manifestem escolhas diversas das professadas pelo proprietário da empresa”.

Como forma de impedir que os réus continuem a violar os direitos acima apontados, o MPT pede a fixação de multa capaz de coibir a reiteração dos ilícitos. Como parâmetro, requer a fixação de multa no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) por infração, acrescida de R$10.000,00 (dez mil reais), por trabalhador prejudicado, nos casos dos pedidos 1 e 2, e de R$ 1.000.00,00 (hum milhão) por dia, no caso dos pedidos 3 e 4.

Esclarece o demandante que pretende defender o primado da Constituição Federal, assegurar a liberdade de orientação política e o direito à intimidade dos trabalhadores que laboram na empresa ré. A finalidade, portanto, é alcançar a garantia que a esses trabalhadores seja resguardado o direito de exercício da cidadania plena, que não pode sofrer restrição ou coação dos Réus.

Salienta a parte autora que o momento pré-eleitoral, permeado pela peculiaridade da fase pós-impeachment, por si só, inflama os ânimos da população e tenciona as relações sociais, exigindo das instâncias decisórias de nosso país, serenidade para lidar com questões relacionadas ao tema, exigindo que nossos esforços se voltem para o que há de objetivo e democrático no nosso país: a Constituição Federal, fruto de construção social, cidadã e democrática.

Alega que, nos dias 01 e 02 de outubro de 2018, foram recebidas 47 notícias de fato na Procuradoria do Trabalho, relatando que o Sr. Luciano Hang, proprietário da empresa Havan Lojas de Departamentos LTDA (CNPJ 79.379.491.0008-50), estaria coagindo os trabalhadores daquela empresa a votarem em candidato de sua preferência, sob pena de serem demitidos.

Acrescenta o MPT que, analisando o teor dos fatos denunciados a este Parquet, verifica-se que o réu, Luciano Hang, promoveu, um “ato cívico” ao qual todos os empregados da administração foram obrigados a participar.

Relata que, em tal ato, o proprietário da rede de lojas, após fazer com que os funcionários cantassem o hino nacional, fez a defesa do candidato à presidência da república de sua predileção, por quase meia hora, constrangendo os seus funcionários a votarem em referido candidato, sob ameaças abertas de fechamento de lojas e dispensa de funcionários. Mencionou o proprietário da ré, ainda, que realiza pesquisas eleitorais frequentes entre seus empregados para saber em quem irão votar, que é de seu conhecimento que cerca de 30% dos empregados votariam em branco ou anulariam seus votos, e quem não votar no candidato por si indicado seria prejudicial ao país, à empresa e aos empregos dos colaboradores ouvintes, reforçando novamente as ameaças veladas de perda de empregos.

Destaca o demandante que, dentre outras manifestações de cunho político-eleitoreiro, o proprietário da ré, Luciano Hang, falou sobre uma suposta ameaça comunista, desferindo ofensas e menosprezo a outros partidos não alinhados com a ideologia propagada pelo candidato por si defendido.

Transcreve a inicial parte do que afirma o réu no episódio:

“A esquerda, nos últimos 30 anos, e estou dizendo hoje, o PSDB, o PT, principalmente, esses partidos de esquerda como PSOL, PcdoB, PDT, são partidos alinhados com o comunismo. E o comunismo do mal, aquele comunismo que quer destruir a sociedade, destruir a família, destruir os empregos” (…) Talvez a Havan não vai abrir mais lojas (sic). E aí se eu não abrir mais lojas ou se nós voltarmos para trás? Você está preparado para sair da Havan? Você está preparado para ganhar a conta da Havan? Você que sonha em ser líder, gerente, e crescer com a Havan, você já imaginou que tudo isso pode acabar no dia 7 de outubro? E que a Havan pode um dia fechar as portas e demitir os 15 mil colaboradores”(..) Vamos trabalhar até 07 de outubro para fazermos nossa parte para levarmos o nosso barco para um porto do bem. Que nós não venhamos a ser uma Venezuela, uma Cuba ou uma Coréia do Norte. Não vote em comunistas e em socialistas que destruíram este país. Nós somos hoje frutos dos votos errados que nós demos no passado. Nós não podemos errar. Conto com cada um de vocês. Dia 07 de outubro vote 17, Bolsonaro para nós mudarmos o Brasil. Obrigado pessoal. Conto com cada um de vocês”.

Assevera o Ministério Público do Trabalho que tal ato foi filmado e transmitido ao vivo nas redes sociais, bem como divulgado amplamente para todos os empregados de todas as filiais da empresa espalhadas pelo país. Frisa que os fatos são de conhecimento notório ganhando abrangente repercussão em todo o Brasil e que tais atitudes intimidam, constrangem, coagem, admoestam e ameaçam os empregados da empresa ré quanto a suas escolhas políticas, em evidente prejuízo aos seus direitos fundamentais à intimidade, igualdade e liberdade política. E tem especial gravidade considerando a proximidade das eleições presidenciais no próximo domingo. Por fim, afirma que, dada a urgência que o caso requer, a fim de obter um provimento jurisdicional capaz de resguardar os direitos dos trabalhadores, sem prejuízo da ação principal a ser ajuizada no prazo legal, não resta outra alternativa a este Ministério Público, que não o ajuizamento da presente ação.

No caso, foram apresentados diversas notícias de fato denunciadas dia 01/10/2018 e 02/10/2018 e informações do estabelecimento no CAGED/MTE, sendo que o Ministério Público do Trabalho noticia que embora o vídeo tenha sido transmitido a suas 129 filiais da empresa por todo o país, foi gravado em Brusque. Todavia, embora não conste nos autos, o vídeo mencionado foi amplamente divulgado nas redes sociais, comprovando que de fato promoveu, ato com seus empregados, no qual foi cantaram o hino nacional e fez a defesa do candidato à presidência da república de sua predileção, constrangendo os seus funcionários a votarem em referido candidato, sob ameaças abertas de fechamento de lojas e dispensa de funcionários.

Relatado. Passo à análise.

DA TUTELA ANTECIPADA EM CARÁTER ANTECEDENTE

O Ministério Público do Trabalho postula tutela de urgência, em caráter antecedente, utilizando-se do disposto no artigo 303 do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável ao Processo do Trabalho e à disciplina da Ação Civil Pública intentada nesta Justiça do Trabalho. Assim se observa do entendimento consolidado na Instrução Normativa nº 39 do Tribunal Superior do Trabalho, do qual não se diverge.

Conforme Bedaque (CPC ANOTADO, Curitiba, OAB/PR, 2015, p. 528),

Duas são as espécies de tutela de urgência: cautelar e antecipada. A primeira caracteriza-se pela natureza meramente conservativa. Limita-se a proteger bens, pessoas ou provas, a fim de que, quando e se possível a concessão da tutela final e definitiva, momento em que a verossimilhança transforma-se em certeza, possa o titular do direito dele usufruir. São exemplos típicos o arresto, o sequestro e a produção antecipada de provas. Já a tutela antecipada busca esse mesmo objetivo mediante a técnica da antecipação provisória de efeitos da tutela final. Sua eficácia prática confunde-se, ainda que parcialmente, com a da tutela final (alimentos provisórios, separação de corpos, liberação de mercadorias apreendidas, etc.).

Quanto à concessão de medidas em caráter antecedente, como ocorre no presente caso, exige-se, além de elementos que evidenciem a probabilidade do direito, o perigo de dano em caso de demora na prestação e o risco ao resultado útil do processo (CPC, art. 300, caput), que a urgência seja contemporânea à propositura da ação (CPC, art. 303, caput).

A MATÉRIA EM APREÇO

Há verossimilhança nas afirmações da petição inicial, o que dispensa, para o fim de apreciação dos pleitos ora formulados, a oitiva da parte adversa, quanto aos seguintes fatos, que se tornaram públicos e notórios por intenção do próprio réu LUCIANO HANG, que postou tais conteúdos em redes sociais:

– o réu LUCIANO HANG, em pelo menos dois estabelecimentos da empresa HAVAN LOJAS DE DEPARTAMENTOS LTDA., um deles em Brusque e outro em São Bento do Sul, ambos no Estado de Santa Catarina, realizou reuniões com um significativo número de seus funcionários, tendo a última delas ocorrido nesta segunda-feira passada, dia 1º de outubro de 2018, fato com ampla divulgação e publicidade em redes sociais – Facebook e Twitter – o que consta de vídeos cujo link de publicação se encontra na peça exordial: https://www.facebook.com/LucianoHangOficial/videos/2159029844417622/?fref=gs&dti=2205327913074430&hc_location=group;

– o réu LUCIANO HANG, num dos vídeos, à frente de seus empregados, todos utilizando uma camiseta verde, com os dizeres “O BRASIL QUE QUEREMOS SÓ DEPENDE DE NÓS” promoveu ato dentro de um dos estabelecimentos da ré HAVAN LOJAS DE DEPARTAMENTOS LTDA. em favor de um dos candidatos ao cargo de Presidente da República no pleito que se aproxima;

– no discurso feito pelo réu LUCIANO HANG na reunião de 1º de outubro há passagens que merecem destaque, como: a que indica que este realizou pesquisas eleitorais entre seus colaboradores, constatando que 30% deles votariam em branco ou anulariam seu voto; e a que questiona aos seus ouvintes, em caso de resultado eleitoral diverso daquele que preconiza: Você está preparado para sair da Havan? Você está preparado para ganhar a conta da Havan? Você que sonha em ser líder, gerente, e crescer com a Havan, você já imaginou que tudo isso pode acabar no dia 7 de outubro? E que a Havan pode um dia fechar as portas e demitir os 15 mil colaboradores?”

– por fim, na parte final da fala do réu LUCIANO HANG, após tais indagações retóricas, consta: “Conto com cada um de vocês”.

São estes os fatos que, segundo os Procuradores do Trabalho que assinam a peça inicial, levam à urgência da medida judicial intentada, na medida em que estaria comprometida a liberdade de escolha política dos empregados da empresa HAVAN LOJAS DE DEPARTAMENTOS LTDA., por receio de, não votando no candidato de predileção do réu LUCIANO HANG, perderem seus empregos.

Nenhuma dúvida subsiste quanto à repercussão social dos fatos acima. As redes sociais foram bombardeadas com comentários favoráveis e contrários à conduta do réu. Alguns veículos de comunicação chegaram a debater o assunto, é verdade, porém sem a ênfase que as redes sociais deram ao episódio.

É necessário frisar se há e quais são as questões a serem apreciadas no âmbito da Justiça do Trabalho quanto aos fatos acima reproduzidos.

Não cabe a esta Justiça, de plano, a análise de quaisquer condutas aqui mencionadas sob o aspecto de possíveis violações à legislação eleitoral, como aventado pelo Ministério Público do Trabalho. Esta deve ser objeto de análise pela Justiça Eleitoral, uma vez que venha a ser provocada.

Mas há, nas condutas em discussão, envolvimento da relação entre empregador e empregados, com atos praticados no ambiente de trabalho, o que diz respeito à Justiça do Trabalho e, por tal razão, cumpre analisar.

A Democracia pressupõe a liberdade.

Toda e qualquer pessoa tem garantida pela Constituição a liberdade de expressão, inclusive de expressar sua preferência político-partidária, bem como aquelas opções com as quais seu pensamento não coincide e considera prejudiciais ao País, à sua pessoa ou à sua condição de empresário, trabalhador assalariado, ou qualquer outra. Tal liberdade existe, repiso, ainda que o voto seja secreto no momento em que é realizado na urna.

Não se trata, portanto, de reprimir, tolher ou censurar a opinião do réu LUCIANO HANG e suas manifestações políticas a favor ou contra pessoas, agremiações políticas, convicções filosóficas ou regimes de governo. Esta liberdade de agir permanece íntegra, desde que respeitada a legislação pátria. É neste ponto que se precisa de análise cuidadosa.

O que está em apreço é até que ponto o réu LUCIANO HANG, usando de sua condição de proprietário de uma empresa que emprega cerca de 15 mil pessoas, como ele próprio relata, pode expressar suas opções políticas no ambiente de trabalho dos empregados da ré HAVAN, da qual é sócio proprietário, e mais que isso, em que condições poderia ou não praticar tal conduta.

Também está em apreço se LUCIANO HANG, como sócio proprietário da empregadora, pode ou não realizar enquetes tendo por entrevistados os empregados da HAVAN, com finalidade de perquirir a respeito das opções político-partidárias destes, bem como que uso pretendia ou pretende fazer de tais informações.

Pois bem.

O papel do Estado, com o passar dos anos, e especialmente no período pós-Revolução Francesa, de cunho liberal, com a evolução decorrente do período pós-guerras, em que a Declaração Universal dos Direitos do Homem, erigida pelos países signatários para o mais amplo respeito aos valores éticos, exige tratamento digno a todos os seres humanos, o que se espraia por todas as expressões da natureza humana. Deste modo, incumbe aos órgãos do Estado atuar como orientador da ação individual, em benefício do interesse coletivo, protegendo e concedendo a máxima efetividade aos direitos fundamentais.

Perez Luño (Los Derechos Fundamentales, 8. ed., Madrid: Tecnos, 2004, p. 22) frisa que, em sua dimensão subjetiva, os direitos fundamentais tendem a tutelar a liberdade, autonomia e segurança das pessoas não apenas frente ao poder, mas também frente aos demais membros do corpo social.

No que toca ao direito brasileiro, está este impregnado dos mesmos fundamentos já citados, fazendo-se coro com Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado quando afirmam que os três eixos centrais da Constituição de 1988 são a incorporação do conceito de Estado Democrático de Direito, a arquitetura principiológica humanística e social e o reconhecimento de direitos fundamentais da pessoa (A Reforma Trabalhista no Brasil. São Paulo: Ltr, 2017, p. 22).

Liberdade pressupõe responsabilidade, e não há liberdade absoluta em nenhuma ordem jurídica, na medida em que é necessário respeitar os direitos dos nossos semelhantes. Não podemos fazer tudo o que temos vontade de fazer sem observar que impactos isso traz a outras pessoas, a uma coletividade ou à sociedade.

É o que enuncia a Constituição da República, em seu artigo 5o, incisos IV e V. Exerce-se a liberdade de expressão, porém assegurando-se o direito de resposta proporcional à expressão que seja considerada em agravo a outro indivíduo ou grupo, bem como indenização por danos causados pelo abuso do direito de livre expressão.

Da mesma forma, o inciso X do mesmo artigo 5o assegura o direito à manutenção da privacidade e da intimidade, apenando-se com indenização quem viole ou ameace violar o patrimônio moral do indivíduo.

Decorre ainda das regras constitucionais fundamentais a liberdade de consciência e de crença, de modo que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”.

Daí a pergunta: Pode um empregador declarar seu voto para um candidato a seus empregados? Entendo que sim, especialmente se o faz de modo ainda mais aberto, em declarações públicas, na imprensa ou em redes sociais. Deriva do processo democrático que cada um possa exercer plenamente seus direitos políticos, seja um empresário, seja um empregado.

Porém, há uma distância considerável entre apenas declarar seu apoio político a qualquer candidato ou agremiação político-partidária que seja e a forma como se deu a abordagem no caso presente.

Seguindo a cronologia dos fatos, os réus promoveram ao menos uma enquete entre seus funcionários (não se sabe em qual extensão, se em apenas um, mais de um, ou em todos os estabelecimentos) para saber da intenção de voto destes, também sendo até aqui desconhecido o teor das indagações – se chegavam a perquirir sobre candidatos, ou se apenas limitado a saber se votariam de forma válida ou não-válida para fins de contagem de votos. No mínimo, havia como saber quantos responderam que iriam votar nulo ou em branco, ante a declaração do réu LUCIANO HANG, constante do vídeo publicado no Twitter, de que 30% responderam que anulariam ou deixariam em branco o voto para Presidente.

Depois, em uma prática que já é discutível sem se tratar de questões políticas, promoveu o mesmo réu em estabelecimento da HAVAN uma manifestação em que não só fez campanha para um candidato às eleições, mas colocou em xeque a continuidade de todos os contratos de trabalho firmados pela ré HAVAN caso houvesse resultado desfavorável sob a sua ótica.

O tom da fala do réu aponta no sentido de uma conduta flagrantemente amedrontadora de seus empregados, impositiva de suas ideias quanto a pessoa do candidato que eles deveriam apoiar e eleger.

Nenhuma dúvida paira sobre o estado de subordinação inerente à relação empregador-empregado, no curso do contrato de trabalho: subordinação esta que, nas palavras de De Plácido e Silva (Vocabulário Jurídico, Rio de Janeiro: Forense, 1990, v. II, p. 274), corresponde “à submissão, à obediência às ordens de outrem, seja em relação a coisas ou pessoas, a revelar sempre a condição que lhe é imposta para que se submeta a regras ou a determinações derivadas ou oriundas do regime que lhe é estabelecido”.

Deste estado de subordinação se conclui existir um poder exercido pelo empregador em relação a seus empregados, que a doutrina brasileira convencionou chamar de “poder empregatício”. É este poder, tal como outro qualquer, exercido dentro de limites, fora dos quais há abuso. Trata-se de “democratizar também a sociedade civil, inclusive o mercado econômico e suas empresas, que ostentam, conforme se conhece, vínculos de poder assimétricos…” (Delgado e Delgado, op. cit., p. 97).

É certo que não há uma regra jurídica que trate especialmente do problema em evidência mas também é certo que não há qualquer regra legal que afirme ter o empregador o direito de se imiscuir na vida particular de seus empregados, seja em questões familiares, religiosas, filosóficas ou políticas.

Prevê, quanto à ausência de regras legais específicas, o art. 8º da CLT:

Art. 8º As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Em seguida, o art. 9º da CLT dispõe: “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.”

A respeito das fraudes no âmbito das relações de trabalho, lembra Arnaldo Sussekind que estas podem decorrer de ato unilateral do empregador, ao usar maliciosamente de um direito, com objetivo de desvirtuar um preceito jurídico (Instituições de Direito do Trabalho, 14. ed. São Paulo: Ltr, vol. 1, p. 218). O uso malicioso de um direito deixa de ser normal: passa a ser um abuso de direito.

A respeito do intuito fraudatório, Josserand (El Espíritu de los Derechos y su Relatividad, trad. esp. 1946, p. 289), dissertando sobre a jurisprudência em direito comparado, conclui que

o ato será considerado normal ou abusivo segundo se explique ou não por um motivo legítimo, que constitui, assim, a pedra angular de toda a teoria do abuso de direitos; estamos obrigados a pôr nossas faculdades ao serviço de um motivo adequado a seu espírito e a sua missão, pois, do contrário, não as exercitamos propriamente; abusamos delas.

Sob outra vertente de abordagem, o caso em exame comporta a necessidade de revisitar problemas ligados à História do Brasil, notadamente pela conhecida expressão “voto de cabresto”, que tem origem na mocidade de nossa República e significa a tentativa – muitas vezes bem sucedida – de impor a grupos de pessoas a escolha política ditada por uma pessoa dotada de maior poderio dentro de certas comunidades. Neste ponto, concorda-se com Letícia Pinto Ferreira (Parassubordinação: a dialética das metamorfoses justrabalhistas para uma nova era colaborativa, São Paulo: Ltr, 2017, p. 88): “Como os acontecimentos humanos não dão salto, haja vista seguirem uma linha cuja composição pode ser refeita para análise, torna-se útil para quem vive no presente ver qual foi a experiência do passasdo que rendeu os fatos de hoje.”

Aos fatos, e sua subsunção ao Direito.

O empregador, em sua relação com empregados, ainda que tenha por finalidade única a atividade político-partidária – caso dos partidos políticos – não pode querer que seus contratados sejam, invariavelmente, seguidores do mesmo perfil ideológico. Por esta razão, considera-se discriminatória a dispensa de empregado por manifestar opção política diversa daquela que é a de seu empregador.

Como citado em acórdão da lavra do Min. Augusto César Leite de Carvalho, o qual se aplica à situação ora apreciada,

(…) A situação importa típico caso de incidência do instituto que a doutrina jurídica moderna, sobretudo espanhola, denomina garantia de indenidade. A referida garantia consiste em “uma técnica de proteção do exercício dos direitos fundamentais”, segundo a síntese feliz do doutrinador espanhol Casas Baamonde. Não obstante a expressão seja recente, trata-se de “uma nova denominação da ineficácia dos atos empresariais lesivos de direitos fundamentais”, como aponta outro doutrinador daquele país – Rodríguez-Piñero.

Desse modo, sempre que alguém exige a proteção de um direito fundamental afeto à liberdade ou a uma prestação de direito social, à pessoa privada ou pública obrigada a atender a demanda é vedado retaliar, vingar-se pela queixa ou reclamação que lhe é dirigida, pois tolerar a represália do demandado importaria subtrair do direito fundamental descumprido sua plena efetividade, ou a possibilidade de ele se realizar materialmente. O ato de represália é, por isso, e sem mais, radicalmente nulo.

Um outro jurista espanhol, Álvares Alonso, define que, apesar de seu uso preponderante em relação às despedidas que intentam opor-se ao exercício do direito fundamental de tutela judicial efetiva, o conceito garantia de indenidade é associado a várias outras possibilidades:

“A amplitude de faculdades que integram os poderes empresariais, assim como o aspecto de a relação laboral prolongar-se no tempo, propiciam que as represálias possam aparecer sob distintas formas (despedidas, sanções disciplinares, transferências, remoções, alteração funcional, privação de complementos salariais etc.) e em momentos diversos (durante o desenvolvimento da relação de trabalho, no momento de sua extinção e, inclusive, antes e depois do período de vigência do contrato). Pois bem, a garantia de indenidade, em princípio, gera efeitos frente a todo esse elenco de medidas de retorsão imagináveis, com inteira independência de qual seja o instrumento ou embasamento escolhido pelo empregador para prejudicar o trabalhador”. (TST, ARR – 2223-30.2014.5.17.0003, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 19/10/2016, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 11/11/2016 – sem grifo no original)

Consequentemente, se é vedado retaliar posicionamentos diferentes, não seria diferente a conclusão quando a retaliação se dá de modo velado, em tom de ameaça. Não há necessidade de concretização dos efeitos nocivos da conduta antijurídica. A ordem jurídica protege não só contra a lesão, mas de mesmo modo contra a ameaça a lesão de direitos.

Do mesmo julgado colhe-se que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a relevância da pretensão ligada à garantia de indenidade em sua jurisprudência,ao considerar que, se “de um lado reconhece-se o direito do empregador de fazer cessar o contrato a qualquer momento, sem que esteja obrigado a justificar a conduta, de outro não se pode olvidar que o exercício respectivo há que ocorrer sob a égide legal e esta não o contempla como via oblíqua para se punir aqueles que, possuidores de sentimento democrático e certos da convivência em sociedade, ousaram posicionar-se politicamente, só que o fazendo de forma contrária aos interesses do co-partícipe da força de produção” (STF, RE 130206-PA, relator Ministro Ilmar Galvão, DJ de 14/8/1992 – sem grifo no original).

A mera formulação de pesquisas de cunho eleitoral já invade a intimidade e a privacidade dos empregados, pois o voto é secreto e deve-se garantir que a pessoa não queira manifestar-se a respeito. Mesmo as pesquisas autorizadas previamente pela Justiça Eleitoral são feitas a pessoas que, apenas voluntariamente, expressam sua opinião, podendo se recusar a participar da enquete. Logo, não se pode querer que empregados sejam instados ou solicitados, compulsoriamente ou não, a afirmar a seu empregador suas opiniões filosóficas, político-partidárias, ou quaisquer outras, sob qualquer pretexto. O empregador não tem o direito de invadir tal esfera. Ou seja, já se vê caracterizado o abuso do poder empregatício neste particular.

A situação se agrava quando, posteriormente a este fato, coloca-se de forma subreptícia sob a espada de Dâmocles o emprego de todos os 15 mil empregados – evidentemente, com ênfase para aqueles que declararam voto a outro candidato ou, como fica claro na fala do réu, os que pretendem não exercitar o voto em qualquer candidato presidencial. Revela-se aí, sem dúvidas, conduta que se enquadra como assédio moral.

Para que se chegue a esta conclusão, basta indagar qual o sentimento de um empregado dos réus que, tendo definido sua opção por outro candidato que não o de seu empregador, ou pelo voto nulo, ou em branco, ou ainda, esteja indeciso: sentir-se-á livre para votar, ou com receio de colocar seu emprego em risco, exercitará tão somente um “voto de cabresto”?

Da mesma forma, enquanto o réu se sente livre ao extremo, não apenas para declarar seu apoio político, mas para induzir seus empregados a votarem no candidato que é de sua preferência, será que os seus empregados se sentem livres para, ao menos, externar alguma divergência? Entoarão coros em favor do candidato do empregador apenas para não perder o emprego, tal como acontece nos rituais religiosos já considerados abusivos nos ambientes de trabalho?

Em suma, qualquer brasileiro que tenha uma relação de emprego pode ser induzido a votar ou deixar de votar em quem quer que seja por seu empregador, em reunião dirigida a este fim, no ambiente e no horário de trabalho, tendo o empregador também o direito de declarar que, caso não vença quem ele deseja, todos “receberão as contas” e, por fim, de afirmar que “conta com todos”?

Evidentemente que a resposta a todas estas perguntas é não. A resposta do Poder Judiciário a esta conduta, caso fosse em sentido oposto ao que sustenta o Ministério Público do Trabalho, abriria um lamentável precedente, a autorizar quaisquer empregadores a exercer sua influência – com o receio natural da perda do emprego pelo resultado das urnas, ainda que não expressamente mencionada – a quaisquer empregados.

O receio da perda do posto de trabalho, em tais circunstâncias, não dependeria mais das derivações da economia ou dos humores do mercado, mas sim de uma retaliação do empregador-réu, como um aviso prévio com data marcada: o dia da publicação do resultado final das eleições presidenciais.

A doutrina trabalhista, tanto quanto a jurisprudência, já tiveram oportunidade de se debruçar sobre situações similares.

Lamentavelmente, não é de hoje que o Judiciário Trabalhista precisa decidir a respeito de casos desse porte. Já nos idos de 2007, a respeito do certame eleitoral para cargos municipais imediatamente anterior, o Tribunal Regional do Trabalho do Paraná proferiu decisão em que rechaçou conduta semelhante:

ASSÉDIO MORAL. ATOS DE COERÇÃO PARA DIRECIONAMENTO DO VOTO EM ELEIÇÕES MUNICIPAIS. ATENTADO À DIGNIDADE HUMANA E AO LIVRE EXERCÍCIO DA CIDADANIA. INDENIZAÇÃO DEVIDA. A imposição de determinada posição política afronta o livre exercício da cidadania e a dignidade da pessoa humana. Praticada no ambiente de trabalho, a conduta ilícita ganha contornos ainda mais perversos, pois coloca de um lado o empregador, em inegável posição de superioridade, e de outro o trabalhador, pressionado pela necessidade de manter o emprego. Nesse cenário, é irrelevante que a coerção seja exercida por superior hierárquico ou por colegas que, a mando ou por orientação do empregador, também podem cometer o assédio moral. Recurso a que se nega provimento, no particular, para manter a condenação pelos danos morais. (RO TRT-PR-02535-2005-562-09-00-6, 2ª Turma, Relatora Marlene Suguimatsu, julgado em 28.08.2007)

Como muito bem ponderado pelo Ministério Público do Trabalho, a recente Lei 13.467/2017, em seu art. 510-B, faz referência explícita à atribuição conferida à comissão de representantes de empregados de “assegurar tratamento justo e imparcial aos empregados, impedindo qualquer forma de discriminação por motivo de sexo, idade, religião, opinião políticaou atuação sindical” (inciso V), o que também conduz à noção de que a conduta dos réus, no caso, é temerária.

Neste sentido, as lições do Ministro do TST Augusto César Leite de Carvalho (Direito do Trabalho: Curso e Discurso, 2. ed. São Paulo: LTr), já mencionadas na peça de ingresso, levam à conclusão de que cabe a tutela jurisdicional com vistas a inibir condutas do gênero, em que há a indução do trabalhador “a colaborar para o sucesso ou fracasso de uma campanha ideológica ou política” ou a participar de reuniões com fins eleitorais, tais como comícios, passeatas etc. A reunião de que se tem notícia pela veiculação promovida pelo réu em redes sociais se assemelha, claramente, a atos desta espécie.

DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA JUDICIAL POSTULADA

Vislumbro, portanto, a probabilidade do direito invocado pelo Ministério Público, direito este que todo empregado possui de não ser induzido a votar em quem quer que seja, em razão de ameaças de perda do emprego, por afrontada a liberdade de consciência política. Mais ainda, o direito de não ser atingido em sua privacidade e intimidade, ao ser exigido deles responder a seu empregador sobre suas intenções de voto.

Quanto ao perigo de dano em caso de demora na prestação jurisdicional de urgência, vislumbra-se pela proximidade do pleito eleitoral, devendo haver pronta resposta do Judiciário para a correção da conduta patronal, evitando-se a ocorrência de empregados moralmente assediados para a eleição.

O risco de prejudicar o resultado útil do processo é presente, em razão de que o momento em que pode ocorrer a materialização da violação do direito de livre manifestação política é, de início, o escrutínio do próximo domingo, podendo haver, ou não, votação em segundo turno. E este também é o fundamento pelo qual se observa que a urgência é contemporânea à propositura da medida.

Por fim, não se verifica perigo de irreversibilidade da decisão nos pleitos formulados na inicial, pois não há qualquer afetação patrimonial, tampouco prejuízo ao exercício dos direitos políticos de todos os envolvidos, seja o réu LUCIANO HANG, sejam os empregados da HAVAN.

DOS PLEITOS FORMULADOS E SUA ANÁLISE

O primeiro pleito formulado é de se absterem os réus, imediatamente, por si ou por seus prepostos, de adotar quaisquer condutas que, por meio de assédio moral, discriminação, violação da intimidade ou abuso de poder diretivo, intentem coagir, intimidar, admoestar e/ou influenciar o voto de quaisquer de seus empregados à Presidência da República no próximo domingo, dia 07/10/2018 e, se houver segundo turno, no dia 28/10/2018.

A pretensão merece guarida, como já descrito no item anterior. Revela-se atentatória de direitos fundamentais – especialmente os direitos políticos dos empregados – toda e qualquer conduta praticada pelos integrantes do polo passivo para que venham a votar em algum candidato ao cargo de Presidente da República. Nem se diga que na fala do réu LUCIANO HANG não há tal conotação. Logo após dizer que poderia despedir os 15 mil empregados, este termina a fala afirmando: “conto com cada um de vocês”, o que indica a intenção de ordenar o comportamento de votar em um candidato, o de sua predileção. Deverão os réus, doravante, pessoalmente ou por prepostos, absterem-se de tais condutas. Defiro.

O segundo pleito é que os réus, imediatamente, por si ou por seus prepostos, venham a não obrigar, exigir, impor, induzir ou pressionar trabalhadores para realização de qualquer atividade ou manifestação política em favor ou desfavor a qualquer candidato ou partido político.

Também reconheço o cabimento desta pretensão. Não cabe ao empregador, no ambiente de trabalho de seus empregados, promover atos políticos em favor ou desfavor de candidatos ou agremiações, fazendo-os de “claque”. Nem há como ponderar que a participação dos empregados é livre e espontânea, na medida em que o eventual não comparecimento, ainda mais durante o expediente, poderia ser facilmente constatado e penalizado com represálias injustas. Vedadas tais condutas, portanto. Defiro.

O terceiro pedido é que se abstenham os demandados, imediatamente, por si ou por seus prepostos, de realizar pesquisas de intenção de voto entre seus empregados.

Como já externado linhas atrás, não há fundamento jurídico para que o empregador queira se imiscuir na esfera de privacidade e intimidade de seus empregados para escrutinar-lhes intenções de voto, ainda mais quando fica claro o intuito de captar votos em favor de um candidato a cargo político em particular. Vedada a conduta, da mesma forma. Defiro.

O quarto pedido é no sentido de que os réus divulguem, em até 24 horas da ciência da decisão judicial concessiva da liminar ora requerida o seu inteiro teor, a todas lojas e unidades administrativas da rede no Brasil, afixando-se cópia da integralidade da decisão judicial no quadro de aviso de todas as unidades lojistas e administrativas, de modo a cientificar os empregados quanto ao seu direito de escolher livremente candidatos a cargos eletivos, bem como quanto à impossibilidade e ilegalidade de se realizar campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo, intimidando, admoestando ou influenciando o voto de seus empregados, com abuso de poder diretivo.

O pleito merece guarida, funcionando como direito de resposta, proporcional ao agravo, no tocante à violação até aqui praticada quanto ao direito de livre escolha político-partidária dos empregados da ré e que ainda pode vir a se materializar caso não se dê ampla divulgação da presente decisão. Defiro, para o cumprimento até sexta-feira, dia 5/10/2018, impreterivelmente. Os réus deverão comprovar, por meio de fotografias tiradas em cada estabelecimento e juntadas aos autos também até o dia 5/10/2018, o cumprimento desta parte da decisão.

A quinta pretensão é a veiculação, em até 24 horas da ciência da decisão judicial concessiva da liminar ora requerida, vídeo em todas as redes sociais dos Réus, cujo teor deve restringir-se à fiel leitura da decisão judicial concessiva da liminar ora requerida, de modo a cientificar os empregados quanto ao seu direito de escolher livremente candidatos a cargos eletivos, bem como quanto à impossibilidade e ilegalidade de se realizar campanha pró ou contra determinado candidato, coagindo, intimidando, admoestando ou influenciando o voto de seus empregados, com abuso de poder diretivo.

Pelos mesmos fundamentos acima expostos – o direito de resposta proporcional ao agravo cometido – deverão os réus providenciar a publicação, nas mesmas redes sociais em que foram publicados os vídeos objeto da presente demanda (Facebook e Twitter), de um outro vídeo, desta feita contendo o inteiro teor da presente decisão, até o dia 5/10/2018. Defiro, devendo os réus comprovar o cumprimento, apresentando por petição os links correspondentes às publicações ora determinadas.

O último dos pleitos formulados é que este Juízo assegure a veiculação do direito de resposta da coletividade representada pelo Ministério Público do Trabalho, qual seja, a coletividade de trabalhadores prejudicados, às expensas dos réus, em pelo menos três canais de grande audiência da rede nacional, em horário nobre, por pelo menos três dias até as eleições presidenciais, com o seguinte teor ou com teor semelhante a ser definido por este r. juízo: “Atenção: A Havan e seu proprietário, Luciano Hang, em cumprimento à DECISÃO JUDICIAL proferida na Ação Cautelar n. (…), ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, vêm a público afirmar o direito de seus empregados livremente escolherem seus candidatos nas eleições que ocorrerão neste domingo, independente do partido ou ideologia política, garantindo a todos os seus funcionários que não serão tomadas medidas de caráter retaliatório, como a perda de empregos, caso manifestem escolhas diversas das professadas pelo proprietário da empresa”.

Quanto a este, observo que os réus não fizeram uso dos referidos meios de comunicação, bem como que estes não repercutiram as manifestações aqui colocadas sub judice. Diferentemente do que ocorreu nas redes sociais, o alcance dos atos praticados não levou o assunto ao noticiário da mídia de TV. Por conta disso, compreendo que o deferimento ultrapassaria a proporcionalidade entre o agravo e o desagravo, sendo certo que, mesmo sem tal ordem judicial, alguns destes canais da grande mídia podem vir a veicular a decisão, o que não é vedado, graças à liberdade de imprensa, o que pode inclusive ser providenciado pelo próprio Ministério Público do Trabalho, como autor da demanda. Indefiro, pois, esta pretensão.

Por fim, quanto ao pedido de imposição de multa por recalcitrância de condutas em descumprimento da presente decisão, considerando o porte da empresa ré, cujo faturamento anual circunda a cifra de R$ 4 bilhões, segundo dados noticiados pela mídia, fixo o montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) para o caso de os réus prosseguirem na realização das condutas vedadas pela presente decisão, sendo que quanto à pretensão de afixação da decisão nos estabelecimentos, a multa será aplicada por estabelecimento em que não houver a afixação, sem prejuízo da prática de crime de desobediência, tipificado no art. 330 do Código Penal.

Intime-se o Ministério Público do Trabalho desta decisão, bem como para aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias.

Proceda a Secretaria da Vara a intimação dos réus quanto à presente decisão, com urgência.

Nada mais.

FLORIANOPOLIS, 3 de Outubro de 2018

CARLOS ALBERTO PEREIRA DE CASTRO
Juiz(a) do Trabalho Titular

 

 

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