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TRIBUNAL DECIDE QUE, DURANTE A PANDEMIA, TRABALHADORES DE SAÚDE TÊM DIREITO A ADICIONAL DE INSALUBRIDADE EM GRAU MÁXIMO, SEM NECESSIDADE DE PERÍCIA

Rodrigo Trindade

Em possível julgamento paradigmático, o Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (Ceará) decidiu que, durante a pandemia da COVID-19, trabalhadores de hospital demandado devem receber adicional de insalubridade em grau máximo sem haver necessidade de perícia. Reconheceu que “Os efeitos danosos da COVID-19, pandemia que assola o mundo, são notórios e patente a gravidade do patógeno ao qual sujeitos os profissionais da saúde, razão pela qual se infere que o percentual aplicável é de 40%, ou seja, o grau máximo.”

Acórdão de repercussão geral

O acórdão publicado em 28/5/2021 teve origem em mandado de segurança impetrado pelo Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde no Estado do Ceará contra ato de juízo de 1º grau que indeferiu tutela de urgência em seu favor. Em juízo de admissibilidade, o Pleno do Tribunal admitiu como Incidente de Assunção de Competência (IAC) e determinou a suspensão dos processos que tratavam do tema. A partir disso, houve integração no feito originário de diversas entidades interessadas, que apresentaram suas manifestações.

O IAC é instituto inserido pelo Código de Processo Civil de 2015 como espécie de incidente processual para criação de precedentes jurisprudenciais. Está previsto no art. 947 do CPC, tem aplicação em processo já em curso e que trate de tema com relevante questão de direito, com grande repercussão social. Busca-se com o IAC evitar ou corrigir divergências de julgamento em casos futuros e orientar a jurisprudência na região.

O julgamento do processo cearense nº 0080473-55.2020.5.07.0000 (IAC) produziu tese de repercussão geral nos seguintes termos: “É devido o adicional de insalubridade em grau máximo, de 40% (quarenta por cento), independentemente de laudo pericial, aos trabalhadores substituídos pelo SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESTABELECIMENTOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE NO ESTADO DO CEARÁ que se encontrem expostos ao risco biológico do SARS-CoV-2, descritos no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), conforme subitem 9.3.3, “d” e “e”, da NR 9 c/c subitem 32.21.2.1, inciso II da NR 32, enquanto vigorar,  no âmbito do Estado do Ceará, o Estado de Calamidade Pública reconhecido pelo Decreto Legislativo 543/2020, que se estende, no momento, até 31/06/2021″.

Desnecessidade de laudo pericial em questão de risco biológico

A questão da suposta imprescindibilidade de laudo foi afastada pelo TRT-7. Primeiramente, em razão da notoriedade do contexto da pandemia da COVID-19; mas também observando que agentes biológicos não são medidos na forma quantitativa. As atividades que envolvam exposição a risco biológico, prescindem de laudo ou de medição dos limites de tolerância para ter o risco reconhecido, afirmou o acórdão.

No voto de relatoria do Desembargador José Antonio Parente da Silva avaliou-se que, embora ordinariamente haja necessidade de realização de perícias individualizadas para avaliação de insalubridade, nos serviço de saúde, a hipótese orienta para outras averiguações. Especialmente observou que o item 15.1.3 da NR n. 15 traz em seu bojo as atividades em que a insalubridade já é reconhecida, independente de medições ou laudos. Entre elas, estão exatamente as que envolvem risco biológico.

Notoriedade do risco acentuado a profissionais dos estabelecimentos de saúde

A instância julgadora acolheu manifestação do Ministério Público do Trabalho, para o qual o risco de infecção pela SARS-CoV-2, assim como a dificuldade de controle e impossibilidade de neutralização, já estão bem delineados e reconhecidos em diversos documentos emitidos pelo Ministério da Saúde.  O risco de infecção – segundo o MPT – não está relacionado ao tempo de exposição. Também não há possibilidade de previsibilidade ou mensuração da carga viral dos pacientes, eis que atualmente já está reconhecido o potencial transmissor dos contactantes assintomáticos.

O parecer ministerial também chamou atenção para as consequências da necessária recomendação das autoridades de saúde pelo distanciamento e isolamento social: “se o isolamento é medida preconizada para conter o avanço do risco, não há como aferir o risco desse agente biológico em grau médio ou grau máximo”. Desse modo – concluiu o Parquet – “não se vislumbra qualquer obstáculo ao reconhecimento do grau máximo aos profissionais de saúde que estão na chamada ‘linha de frente’ do enfrentamento dessa pandemia.”

Quanto à determinação temporal, o TRT-7 fixou que seja observado decreto da Assembleia Legislativa do Ceará, que reconhece a ocorrência do Estado de Calamidade Pública no estado até 30/6/2021.

O hospital deverá implantar imediatamente na folha do pagamento o adicional de insalubridade em grau máximo de 40% aos trabalhadores que se encontram expostos ao risco biológico do SARS-CoV-2.

Nossa opinião

O julgamento efetuado pelo Regional Trabalhista do Ceará chama atenção por forma e conteúdo.

Primeiro, em razão do instrumento utilizado. Ao optar pelo IAC – um dos novos e ainda pouco manejados meios para uniformização de jurisprudência –, o tribunal mostrou comprometimento na construção de segurança para jurisdicionados e todas as instâncias julgadoras da Região. As questões trabalhistas da COVID-19 são intrincadas e tendem a ampliar tremendamente a complexidade dos processos de todo o país. Embora haja grande número de normativos de enfrentamento – que chamamos de Direito Emergencial do Trabalho – são inúmeras as deficiências e gigantescas as inseguranças. O acórdão consolidado em tese jurídica uniforme do TRT-7 também tende a projetar a decisão e servir de fundamento em julgamentos de outros tribunais.

Segundo, pelo próprio conteúdo da matéria. A emergência sanitária da COVID-19 afeta saúdes financeiras e humanas. Sem descuidar da crise econômica aprofundada com a pandemia, o estabelecimento de medidas de profilaxia e tratamento jurídico adequado a profissionais mais afetados por riscos de contaminação é questão urgente. O tema da contraprestação séria ao trabalho em condições ampliadas de infeção passa obrigatoriamente pela averiguação das condições para pagamento do adicional de insalubridade em grau compatível com condições laborais alteradas. Chama especial atenção o tratamento jurídico aprofundado sobre avaliação de condições de risco biológico e afastamento das ordinárias avaliações quantitativas.

Julgamento verdadeiramente contemporâneo e que tem grandes chances de tornar-se paradigmático.

Ementa do Acórdão

PROCESSO nº 0080473-55.2020.5.07.0000 (IAC) SUSCITANTE: DESEMBARGADOR JOSÉ ANTONIO PARENTE DA SILVA SUSCITADO: TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO 7ª REGIÃO RELATOR: JOSE ANTONIO PARENTE DA SILVA . Julgado em 28/5/2021. Tribunal Pleno.

EMENTA INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA – IAC. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. SINDICATO. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. CONTROVÉRSIA ACERCA DO PAGAMENTO DE ADICIONAL DE IN SALUBRIDADE EM GRAU M ÁXIMO INDEPENDENTEMENTE DE PROVA PERICIAL. COVID-19. APLICAÇÃO DO ART. 947 DO CPC E ART. 166-A DO RITRT7. 1. O caso em apreço entabula hipótese de substituição processual decorrente de direito individual homogêneo cuja origem comum decorre de situação de trabalho sujeito a condição de trabalho insalubre em grau máximo. Aplicabilidade do art. 81 do e art. 8º, III, da CF/88. CDC Legitimidade do sindicato que se reconhece. 2. Incidente de Assunção de Competência – IAC instaurado para deliberar acerca da possibilidade, ou não, de majoração do adicional de insalubridade ao grau máximo, de 40%, independentemente de prova pericial, para aqueles trabalhadores que percebem adicional de insalubridade de grau médio, de 20%, durante o período de duração da pandemia da COVID-19. 3. Para os efeitos do art. 947 do CPC e art. 166-A do RITRT7, fixar tese jurídica: “É devido o adicional de insalubridade em grau máximo, de 40% (quarenta por cento), independentemente de laudo pericial, aos trabalhadores substituídos pelo SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESTABELECIMENTOS DE SERVIÇOS DE SAÚDE NO ESTADO DO CEARÁ que se encontrem expostos ao risco biológico do SARS-CoV-2, descritos no Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), conforme subitem 9.3.3, “d” e “e”, da NR 9 c/c subitem 32.21.2.1, inciso II da NR 32, enquanto vigorar, no âmbito do Estado do Ceará, o Estado de Calamidade Pública reconhecido pelo Decreto Legislativo 543/2020, que se estende, no momento, até 31/06/2021″. 4. No caso concreto, concedida a segurança.

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