“Desemprego quase dobra em cinco anos para quem tem ensino superior no RS”. Por quê?
Desindustrialização e novas leis trabalhistas puxam o desproporcional desemprego universitário no Rio Grande do Sul
Rodrigo Trindade
Há duas particularidades na manchete de Zero Hora que precisam ser melhor analisadas, o regional e o qualitativo. Por que o desemprego avança mais com pessoas de formação universitária? Por que no Rio Grande do Sul está mais acentuada essa “especialidade”?
A reportagem inicia as respostas, citando a crise econômica prolongada e o próprio crescimento do número de gaúchos com nível superior (subiu 31% entre 2014 e 2019). Mas há bem mais que isso.
O desaquecimento da economia é efeito em cascata, e deveria atingir com certa proporção todas as camadas de trabalhadores. Mas enquanto que o desemprego para aqueles que têm ensino médio cresceu 48%, para os trabalhadores de formação superior a alta foi a 91,3%. A subida da desocupação entre universitários é quase três vezes superior à elevação do número de pessoas com diploma superior no mesmo período. Nem a existência da crise, nem a elevação de trabalhadores com formação universitária, portanto, explicam os elementos qualitativo e regional.
Há, sim, dois outros fatores.
Primeiro, a desindustrialização brasileira é particularmente mais calamitosa ao Rio Grande do Sul. Durante décadas, as manufaturas gaúchas supriram produtos de baixa tecnologia e envolveram grandes contingentes de empregados com formação universitária. A importação inconsequente de quem produz muito barato, associada com a falta de incentivos, não apenas substituiu entre países compradores, como alcançou o próprio mercado nacional. Engenheiros, químicos, administradores – pessoas envolvidas na produção de calçados, petroquímicos e siderúrgicos básicos – simplesmente não conseguem ser absorvidas na fantasia de retorno à grande plantation brasileira.
Segundo, por fatores justrabalhistas. De um lado, temos a avidez de cortar custos com pessoas, a partir de contratações rebaixadas (autônomos, cooperativados, intermitentes etc) e substitutivas dos pactos de plenos direitos. Na outra ponta, está o barateamento das dispensas, com o fim da homologação rescisória, “acordos” extrajudiciais e embaçamentos para buscar reparos judiciais. Por fim, a compulsão destrutiva de sindicatos e órgãos de fiscalização vem acabando com a rede protetiva do emprego e repressão das práticas predatórias. As recentes alterações nas leis trabalhistas serviram precisamente para essa alimentação da precarização.
Todo o quadro apenas serve para corroer o poder de compra, alimentar a espiral de repressão ao consumo e impedir qualquer chance de escape da crise.
Mas o mais perverso é jogar a culpa sobre quem trabalha e ainda tenta empreender com ética e dignidade. Não dá mais para lançar conselhos coach de fazer cursinho de reciclagem ou “pensar fora da caixa”, mas convencer-se que mercado azeitado é o civilizado pelo poder público, atuando e promovendo desenvolvimento. Ou seguiremos alimentando estatísticas do desastre.