Remuneração da Magistratura: Que Sociedade queremos?
Remuneração da Magistratura: Que Sociedade queremos?
Rodrigo Trindade de Souza[1]
Guilherme Guimarães Feliciano[2]
Nas últimas semanas, vemos inusitada atenção para remuneração da magistratura. Seguindo adventício arrebatamento de consciência, enquanto requentam-se críticas atreladas à economia nacional e satanizações gerais do funcionalismo, obliteram-se os verdadeiros problemas e interesses envolvidos.
As magistraturas têm se dedicado a combater os piores males nacionais: a corrupção endêmica, o despotismo das potências econômicas e a catastrófica injustiça social. A competência incomoda e daí animam-se as difamações.
O ataque mais recorrente diz respeito ao auxílio-moradia, esquecendo-se tratar de verba com previsão legal desde os anos 70. Legalmente, independe de fatores pessoais e liga-se unicamente à característica profissional da transitoriedade de domicílio.
Toda remuneração de agentes públicos deve ser submetida à aprovação popular. É plenamente democrático repensar — dentro do trâmite legislativo próprio — critérios diversos para pagamento de parcelas assessórias, mas o exame só é sincero se evitar seletividades ocasionais e superar as assimetrias regionais, especialmente entre União e estados.
Avaliar e contrapor rendimentos de diferentes profissões exige análise de conjunto. Magistrados exercem atribuições únicas, com extraordinário rigor de seleção. Enquanto outros ofícios contam com benefícios como FGTS, horas extras, premiações e adicionais diversos, juízes com nada disso contam. São proibidos de manter atividades paralelas lucrativas e, para finalizar, submetem-se a regimes previdenciários e fiscais incomparavelmente mais rigorosos.
A remuneração dos juízes é a mais transparente possível: todos os ganhos são mensalmente disponibilizados na internet, ainda que em detrimento de privacidade e segurança. São esses os dados que costumam ser ardilosamente manipulados em fake news, fazendo com que valores extraordinários — como férias e 13º salário — sejam “vendidos” como ganhos ordinários, para então se cunhar midiaticamente o “marajá” do Judiciário.
Não há boa Justiça sem bons magistrados. E não é possível ter bons juízes sem remuneração adequada. Vida, liberdade, honra e propriedade: essa é a usual matéria-prima do trabalho dos poucos milhares de juízes e juízas, que já são os mais produtivos do planeta e constroem a última trincheira da luta dos humildes contra os mais fortes.
Se, realmente, pretendemos manter a esperança de construção de verdadeiro Estado Democrático de Direito, são esses os valores que devemos ter presentes.
Publicado no jornal O Tempo, de Minas Gerais, edições eletrônica e impressa, de 15.3.2018