Mobilização da magistratura e Ministério Público pela autonomia de atuação (01/12/2016)
DEIXEM OS JUÍZES E PROMOTORES TRABALHAREM
Por Rodrigo Trindade
(Publicado em 1º de dezembro de 2016)
Nossa Constituição fez 28 anos em outubro. Em quase três décadas, nunca vivemos momento tão difícil para concretização dos valores de efetivação da vontade popular, distribuição de justiça e independência entre Poderes, como esse final de 2016.
Em épocas menos civilizadas, juízes e promotores que desagradavam poderosos ou eram assassinados ou mandados ao ostracismo semi-legalizado. A desnaturação do PL 4.850/2016 mantém os mesmos valores coronelísticos daqueles acostumados a governar pelo poder econômico, apropriar-se do patrimônio público e ter a garantia da impunidade.
Pretende-se impor sanções por suposto abuso de autoridade a juízes e promotores, criminalizando suas atividades mais legítimas e impedindo atuação com independência e destemor.
As novas tecnologias da desconstrução do Judiciário iniciaram-se no final do ano passado, com o criminoso e injustificado corte orçamentário da Justiça do Trabalho. Sem qualquer vergonha de ocultar fundamentos, disseram que a magistratura trabalhista punia bem demais aqueles que abusavam do poder econômico e, portanto, devia ela agora sofrer a reprimenda. A ideia seguiu com a PEC 55, também parcialmente aprovada pelo Congresso Nacional e que pretende matar por inanição todos os serviços públicos, incluindo a distribuição de justiça.
A vontade de punir agentes de Estado que cumprem bem demais suas funções de efetivação de direitos e combate a desmandos é repetida com a modificação do PL 4.850/2016. O impensado foi alcançado: valeu-se da desfaçatez de, não apenas ignorar as quase 3 milhões de assinaturas para formação de 10 itens de combate à corrupção para alcançar a espúria iniciativa de inviabilizar atuação de juízes e promotores. A aprovação ocorreu na madrugada, durante momento de comoção nacional com o acidente aéreo da Chapecoense.
Alguém acredita que é coincidência a chegada agora desse projeto? Exatamente quando políticos e empresários poderosos começam a cair?N
ão há meias palavras: pretende-se apenas retaliar e inviabilizar quem combate a corrupção e o abuso do poder econômico, retirando toda a imprescindível independência. Nem na Ditadura pós 1964 algo assim foi proposto.
Hoje, por todo o país, realizamos atos públicos para dizer que não levantamos bandeira corporativista. Ninguém mais que juízes e promotores passam a vida dedicando-se a combater os desmandos, os excessos de agentes públicos.
Defendemos que todo mal ao Estado e aos particulares seja identificado, investigado e punido. E isso é para todos os Poderes.
Judiciário e Ministério Público estão longe de serem considerados causadores da crise ética que nos assola. Se algum lugar pode ser reservado a juízes e promotores é de instrumentos, de remédio e combate ao grande mal nacional.
E aqui não se trata de ser ser coxinha ou mortadela, contra ou a favor da Lava Jato, endeusar ou demonizar esse juiz ou aqueles promotores. A luta é pelo valor da independência, do primado da ética e da justiça.
Em outubro de 1988, a Nação assinou Carta Constitucional marcando a vontade de inaugurar projeto de convivência democrática e promoção de justiça. Hoje, e mais do que nunca, precisamos reafirmar esse compromisso.